sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Estou lendo “Amor e exílio” de Isaac Singer. Na verdade, trata-se de uma junção dos relatos biográficos “Um menino à procura de Deus”, “Um jovem à procura de amor” e “Perdido na América”. Ando reclamando bastante de ser brasileiro e de ter nascido no fim do século XX, mas, é claro, há coisas piores, como ser judeu nas décadas de 20 e 30. E vejam bem, Isaac Singer saiu da Europa logo no começo dos anos trinta. Lendo isso fui procurar algumas informações, principalmente sobre Bogdan Chmielnitzki, que é muito citado neste livro e que se tornou o tema do primeiro livro de Singer: "Satanás em Goray". Encontrei essa página sobre os judeus na Polônia da idade média até o começo do século XIX: http://www.geocities.com/Heartland/Valley/1046/9710/971029_j.html . Estou com um espírito de tradutor no meu corpo, então aproveitem:

“Pela metade do século XVII, a posição econômica e social dos judeus poloneses parecia firmemente estabelecida. Os judeus estavam bem representados nas grandes feiras em que o comércio polonês era centrado. De particular importância para a crescente e poderosa nobreza polonesa foi o papel representado pelos judeus economicamente astutos, que freqüentemente serviam aos nobres como conselheiros e como administradores de seus estados. A estabilidade econômica foi acompanhada por um significativo desenvolvimento político e social. Já em 1551, o Rei Sigismund Augustus garantiu aos judeus o direito de elegerem seus rabbi-chefe e juízes aos quais foram dados poderes para administrarem a justiça da comunidade judia em todas as questões de acordo com os princípios de Halakha. No século XVII o Conselho das Quatro Terras (Grande Polônia, Pequena Polônia, Podolia e Volhynia) foi estabelecido pelos líderes das comunidades judias como um tipo de “Parlamento” e “Corte Suprema” dos judeus poloneses. Para os líderes dos estados poloneses, o concílio servia como um instrumento efetivo para a coleta de impostos nas comunidades judias. Na década de 40 deste século, a vida judia na Polônia era próspera, cimentada numa aliança benéfica e mútua entre os judeus e as classes governantes polonesas. E assim, não é nenhuma surpresa que a Polônia era descrita em termos muito favoráveis na literatura judia do período. A tradução de “Polônia” para o hebreu (“Polin” ou “Polanya”) foi entendida como uma dica das características especiais da vida dos judeus por lá, uma vez que “Po Lan Yah” é em hebreu “Aqui descansa Deus” ! Mas, como temos visto, um significativo nível de animosidade popular contra os judeus já estava presente, e no ano de 1648 esta hostilidade foi dramaticamente elevada como um resultado de uma rebelião nacionalista. Os judeus poloneses sofreram um massacre horribilíssimo.

A rebelião se deu na Ucrânia, onde os cossacos, um bando de servos e cavaleiros robustos e guerreiros, lideraram uma revolta contra os líderes poloneses.Os poloneses e os ucranianos não compartilhavam uma língua comum, e ainda que ambos fossem cristãos, o catolicismo dos poloneses confrontava com a ortodoxia russa dos ucranianos. De qualquer forma, o líder da rebelião de 1648-9 (conhecida como a revolta cossaca), foi Bogdan Chmielnitzki, um homem que é ainda visto por muitos como um herói popular nacionalista e ucraniano. Chmielnitzki e seus cavaleiros cossacos ressentidos com os judeus, viam estes como aliados desprezíveis da tirania política polaca e da opressão econômica. Comunidades judias inteiras foram brutalmente massacradas pelas hordas cossacas. Uma testemunha ocular desses massacres, Rabbi Nathan Hanover, descreveu os horrores...

'Os cossacos se revoltaram contra os judeus com uma crueldade terrível... Alguns deles tiveram suas peles arrancadas e suas carnes foram atiradas aos cães. As mãos e os pés de outros eram decepados e os judeus eram atirados nas estradas, onde carroças os atropelavam e os cavalos marchavam sobre eles... muitos foram enterrados vivos. Crianças eram assassinadas nos seios de suas mães e muitas crianças foram rasgadas ao meio, como peixes... não houve uma morte não natural no mundo que eles não lhes infligiram.' (N. Hanover, Yeven Metzulah, Tel Aviv, 1966, pp.31-2)

Eu percebo que isto é um retrato horrível, que pode ser bem difícil de ler. Mas penso que é importante lê-lo, em ordem para entender o horror daqueles dias. Claramente os cossacos agiram com um profundo sentimento de ódio, e não se pode duvidar que o massacre produziu uma redução no número de judeus poloneses. Centenas de milhares de judeus pereceram nas mãos dos bandos cossacos, e não menos que setecentas kehillot (comunidades) foram destruídas! Neste período de desespero, certamente muitas questões difíceis devem ter surgido. Como seria possível reconstruir ou restaurar algum nível de estabilidade social? Num nível teológico, como era possível que Deus permitisse que Seu povo sofresse tais crueldades?(...)

No ano de 1665, Shabbetai Zvi, um judeu sefardita da Smirnia na Anatólia (hoje Turquia), proclamou-se messias em Jerusalém. Com a ajuda de seu principal discípulo, uma figura carismática chamada Nathan de Gaza (que dizia ser um profeta), o movimento messiânico se espalhou como fogo selvagem através do mundo judeu. Rumores dos poderes miraculosos do Messias abundaram, dez mil judeus rapidamente fizeram preparações para abandonarem seus lares na Diáspora, para assim eles poderem ser miraculosamente transportados “na asas das águias” até Eretz Yisrael! Muitos fecharam suas lojas e iniciaram jejuns especiais e outros tipos extremos de purificações. Aqui vai uma descrição destes eventos bizarros, tomados da “História da Império Turco” de Sir Paul Rycaut (que é um relato de primeira mão do período):

'Alguns judeus se enterraram em seus jardins, cobrindo seus corpos nus com terra até a cabeça, permanecendo em suas camas de sujeira até seus corpos endurecerem com o frio e a umidade. Outros derretiam cera em seus ombros, outros rolavam na neve e atiravam seus corpos na mais fria estação do inverno no mar, nas águas congeladas... Todo o negócio foi deixado de lado, ninguém trabalhava ou abria suas lojas, a menos que se limpasse de suas lojas qualquer merchandise sobre qualquer preço*...'

Bem! Um pouco difícil de acreditar, né? Eu admito que é difícil de imaginar as pessoas fazendo coisas como essas, mas acho que isto tudo testemunha a fé completa e absoluta que esses judeus tinham na vinda do messias, e as medidas extremas necessárias para se purificarem antes da grande Redenção. Creio que isto reflete o quão profundamente os judeus necessitavam ser redimidos neste período de dificuldades. Numa palavra, o “Messias veio”, porque os judeus desejavam desesperadamente que um Messias os salvasse. E assim, o mundo judeu ficou profundamente dividido entre os seguidores de Shabbetai Zvi, e aqueles que o consideravam um impostor. O sultão turco ficou muito preocupado com os efeitos desestabilizadores desta figura messiânica, e por isso prendeu Shabbetai Zvi. No início, Shabbetai manteve sua corte na prisão, dividindo o mundo entre seus fiéis seguidores*, até que ele foi obrigado a escolher entre se converter ao Islã ou encarar a execução pelas mãos dos arqueiros reais. E desse modo, Shabbetai Zvi se converteu ao Islã, e o mundo judeu, ainda cambaleante dos horríveis massacres de 1648-49, agora encarava uma tremenda crise espiritual.”


* Trechos em que duvido um pouco da minha tradução. Aliás duvido da tradução inteira, mas como é de graça, você não pode reclamar.

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