domingo, 30 de dezembro de 2007

Um dos grandes mistérios do século XX é como toda uma nação, e uma nação tão culta como a alemã, sucumbiu ao nazismo. Seria a natureza humana tão ruim a ponto de ser convertida facilmente a uma doutrina tão sanguinária? Acho que a solução do mistério é mais banal que isso.
Estamos tão acostumados a falar negativamente do governo de Hitler (e claro, há milhões de razões para isso) que esquecemos os poucos aspectos positivos dele. O maior deles, sem dúvida, foi a questão econômica. Hitler pegou um país quebrado, com uma inflação tão absurdamente gigantesca que praticamente inviabilizou o uso de papel-moeda, transformando- novamente num país rico e poderoso, tão poderoso que podia sair por aí invadindo outros países, afrontar as outras potências e fazer guerra com o mundo inteiro.

O povão não está interessado em grandes idéias ou ideais. Ele quer saber se tem pão na mesa. Tinha pão antes de Hitler? Não. E depois de Hitler? Tem pão e manteiga, quiçá até presunto. Provavelmente, a maior parte do povo alemão devia pensar “Tenho nenhuma opinião quanto os judeus não. Se esses caras tão sabidos estão falando que os judeus têm culpa, então alguma coisa eles devem ter feito, embora eu não faço a menor idéia do que seja”. Outro pensava “É isso mesmo! Os judeus mataram Cristo! Eles merecem uma punição”. Uma outra parte repetia irrefletidamente o que outras pessoas diziam, como os estudantes universitários igualando Bush e Bin Laden. Outros pensavam “Eles estão apenas agrupando-os num local que é melhor que a habitação de muita gente. Nem acho que é certo, mas não é tão grave. O que importa é que agora todo mundo tá comendo”. O povão não sabia o que era um campo de concentração. Achavam que estavam transferindo os judeus para ajudarem nos esforço de guerra, e não para matá-los sistematicamente. Uma minoria apoiaria as idéias de Hitler quanto aos judeus.
O que quero dizer é que a popularidade de Hitler era alta pelo seu sucesso na economia. A questão dos judeus era irrelevante. A maioria dos alemães nem conhecia um judeu. Não fazia diferença alguma para eles se Hitler os premiasse ou os matasse. Alguém já disse, não sei quem, que o povo tem vocação para servo. Dê-lhes alguma segurança e você os tem.
O mesmo se passou no Brasil há um tempo atrás – numa escala muito menor, é verdade. Não sou esse tipo de louco que gosta de confundir as coisas e igualar o Lula a Hitler. Mas há uma certa simetria na relação de ambos com o povo de seu país. O povo brasileiro sabe, claro, que este governo está entupido pela corrupção. Mas não se interessam. O que importa é que há pão na mesa.
Alguém pode lembrar que pão na mesa não é pouca coisa. Concordo integralmente. Só queria mostrar o que a covardia e a tendência para servidão do povão podem fazer. E na democracia, aka o governo de povão, estes sentimentos devem ser sempre vigiados e, de alguma forma, minorados.

sábado, 29 de dezembro de 2007

Os dez melhores álbuns que descobri em 2007

























































As limitações do cinema

Edukators – 2004 - 5.6

Enquanto via esse filme pensava nas limitações do cinema. É uma boa história, não percebi nenhum furo, você se envolve, se diverte, não é chato nem nada. Mas tem a parte política, né? Trata-se de um filme político, sobretudo. A idéia é que apesar dos erros da esquerda ela teria boas idéias e essas sobreviveriam aos esquerdistas. Boas idéias, tais como sabotar quase toda a rede de televisão européia ou invadir propriedades alheias, enfim. O problema todo é a superficialidade. Se fosse um livro, tenho certeza que as idéias estariam mais desenvolvidas. Mas é só um filme. As idéias não são desenvolvidas. A meu ver acertadamente, pois um filme onde se fica discutindo idéias é meio absurdo. Então fica naquela, quem é esquerdista até gosta e se identifica com as personagens. Quem não é acha engraçado, no máximo. Enfim, a direita pelo menos poderia ser representada por um verdadeiro direitista e não por uma caricatura esquerdista da direita.

O império dos sonhos – 0.5

Gostei do Cidade dos Sonhos. Ao lembrar a beleza daquele filme é impossível não concordar com o talento de Lynch. É muito bonito, você se envolve, a esquisitice do filme te intriga, você quer entendê-lo. Já o Império dos Sonhos é filmado inteiramente com uma câmera digital. Como me disse o Matheus, você tem a impressão de ver um filme gigante no youtube. A maioria das cenas se passa a noite, no escuro, as imagens não são nítidas. Trata-se de um filme B de horror com uma história sem nexo. Não me envolvi, entediei-me horrores. Junto com a precariedade das imagens há a pretensão da história. São jogadas várias peças e você deve montar o quebra-cabeça. Em certo momento alguém pergunta as horas: nove e quarenta e cinco da noite. Você se lembra da velha do começo do filme falando algo sobre nove e quarenta e cinco e sobre meia-noite. Mas o que era mesmo? Não me lembro. Se fosse um livro eu voltava atrás e descobria. Mas estou num cinema, isso é impossível. A pretensão de Lynch é tão grande que ele quer que eu vá no cinema ver seu filme umas dez vezes. Ele quer estudiosos do filme, criando interpretações para aquilo tudo. O Cidade dos Sonhos pelo menos era bonito, e menos selvagem, me parece. Este é feio, confuso e pretensioso. Blé.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Os dez livros que me deram mais prazer em 2007

10 - Memórias de duas jovens esposas – Balzac

Duas jovens mas velhas amigas trocam correspondências no começo do século XIX, narrando suas vidas de recém-casadas. Ambas são felizes a seus modos e permanecem assim durante 80% do romance. E o desgramado do Balzac transforma uma história assim em algo que você começa a ler e não consegue mais parar.

9 – Leibniz´s theory of relations – Massimo Mugnai

Como se trata da lista dos dez livros que mais gostei de ler, e não dez livros que recomendo, incluo este. Recomendo mesmo só para quem estuda Leibniz ou se interessa pela questão da fundamentação ontológica das relações. De qualquer forma, foi uma grande prazer encontrar uma interpretação de Leibniz que aproximou-se tanto da verdade, ou seja, que aproximou-se tanto da minha interpretação.


8 - Os Buddenbrooks – Thomas Mann

Para falar a verdade tem umas partes em que fiquei entediado. Mas em suas melhores partes, meu Deus, que livro bom. A terceira e a quarta parte valem o livro. E no fim tem uma descrição de um dia na vida de um jovem de quinze anos que serve, simultaneamente, para destruir e realimentar nossas saudades desse tempo.

7 – A Marca Humana – Philip Roth

Vale a pena mesmo pelo começo e por uma discussão, lá pelo meio do livro, entre Coleman Silk e Delphine Roux sobre duas visões conflitantes de universidade e do mundo. Mas diferentemente dos Buddenbrooks não há nenhuma parte entediante. Pau dentro do começo ao fim.

6 – São Tomás de Aquino – Chesterton

Coisa fina. Tenho que ler mais coisas como essas, escritores falando diretamente de filosofia. Aqui Chesterton defende uma superioridade de Aristóteles sobre Platão e da doutrina católica tomista e medival sobre a teologia dos patriarcas da Igreja. E ainda tem umas anedotas bastante divertidas sobre a vida desse moço.


5 – O castelo – Kafka

É uma pena esse livro ser inacabado. Com uma premissa que um bom escritor dificilmente conseguiria construir uma novela que não fosse entediante, Kafka faz um romance que, incompleto, possui mais de trezentas páginas e dói terminá-lo. Para mim é melhor que “O processo”. Pronto, falei.

4 - O significado de significado – Hilary Putnam

Peter Burge expõe o mesmo problema de um ângulo mais interessante e dá uma resposta melhor que a de Putnam sobre o problema em “O individualismo e o mental”. No entanto Burge nem aparece na minha lista, por quê? Simples, Burge é chato e Putnam é legal. Foi este o livro de filosofia mais importante do ano para mim só porque me mostrou que é possível escrever filosofia de maneira divertida, clara e profunda.

3 – Amor e exílio - Isaac Singer

Talvez nunca tenha me identificado tanto quanto com um personagem quanto com o próprio Isaac Singer nesses escritos autobiográficos que descrevem a infância até os trintas anos deste. Não sei se o livro é tão bom assim, mas poucas vezes li algo com tanta intensidade.

2 - Os frutos da terra – Gide

Eita, esse livro me tirou de órbita, viu? Que vontade de viajar e viver como um andarilho que me deu. Se algum dia enlouquecer e fizer isso a culpa é do Gide. Caralho, como esse livro é bom. As partes iniciais são inacreditáveis de bom, inspiração pura. Você lê aqueles poemas e não quer mais nada da vida. Depois cai um pouco. Aí tem os textinhos finais, excepcionais, fantásticos, mágicos. Fim da primeira parte. A segunda parte é meio Frankstein, tenta conciliar o epicurismo da primeira parte (escrita quase 30 anos antes) com o catolicismo posterior do autor. Acaba numa espécie de espinosismo, meio confuso, achei. O livro deixa de ser principalmente poético e se torna mais ensaístico. Mas é bom, há trechos excelentes nessa segunda parte também.

1 Ana Karenina – Tolstói

São de setecentas a mil e poucas páginas de prazer delirante. Você lê, lê, lê e não se cansa. Quer mais. Quando acaba dá vontade de chorar, de começar de novo. Como pode? Não sei. É inacreditável mesmo. E Liêvin é outro personagem com quem me identifiquei. Talvez tenha sido com esse livro, lido ainda em janeiro de 2007, que comecei a pensar em morar na roça.

sábado, 22 de dezembro de 2007

Viajo agora de férias. Não sei quando volto. Talvez dia 26, o mais provável em meados de janeiro. Acalmem-se, não cometam suicídio por isso. Congelar-se é mais sensato. Até.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007


quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

A razão para poucas pessoas gostarem de ler é que a leitura é um exercício de solidão e as pessoas não gostam de solidão. Você acaba de ler um livro, acha aquilo fantástico, emocionante, revelador, essas baitolagens todas e vai todo feliz tentar dividir suas emoções com um amigo que a) nunca leu tal livro; b) leu, mas leu há uns 4, 5 anos atrás e não lembra muito bem dele ou c) leu há alguns meses e achou “interessante” e logo pergunta se você leu um outro tal livro, livro este que a) você nunca leu; b) leu, mas leu há uns 4, 5 anos atrás e não lembra muito bem dele ou c) leu há alguns meses e achou “interessante”.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

A vida dos outros (2006) - 3.5

Filme feio pra caramba, sem cor, locações banais. Deve ser para passar o clima da vida sob a burocracia comunista, penso eu. Hmmm... isso deve explicar também a chatice do filme. Como esse filme conseguiu ganhar 42 prêmios, o Oscar de melhor filme estrangeiro, uma boa nota entre os leitores do imdb (8,5)? Eu não devo ter entendido alguma coisa ou então o vi com muito mau-humor. Filme mais supervalorizado desde Cartas de Iwo Jima.

Zodíaco (2007) – 7.5

Normalmente odeio filmes desse tipo porque sempre me perco em alguma parte do enredo e aí não consigo acompanhar mais o resto da história. Esse filme tem duas horas e meia e, creio, consegui entendê-lo todo. Até me interessei pelo gênero de suspense policial. Sempre tive preguiça dele. Talvez compre um Aghata Christie ou um Simenon nas férias. Mas acho que gostei do filme mesmo só porque ele não é um policial clássico, mas antes um policial real. Não tem nenhum detetive fazendo deduções espantosas e o caso prossegue por pistas dadas por telefonemas anônimos. Mas enfim, há umas cenas ruins de assassinato aí pelo meio do filme, um suspenso bobo querendo dar medinho na gente, não gostei disso não.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Poema para meus netos

Também eu trago histórias para contar.
Meus netos ouvirão sobre como seu avô dormiu durante quinze horas seguidas,
sobre certo dia em que ele acordou às onze, almoçou e dormiu logo depois.
Ouvirão sobre como consegui dormir na escuridão do Hades,
que já dormi enquanto um trio elétrico passava,
em baixo de três cobertores,
em cima de um muro,
numa praça, dividindo o jornal com um mendigo alcoólatra,
num castelo, sob um colchão d’água e lençóis de cetim,
na floresta abraçado a um filhote de urso manso, peludo, órfão e vivo,
que dormi enquanto boiava nas ondas do mar Atlântico!
Eu dormia enquanto Tróia ardia em chamas!
Sim, pois estou entre aqueles que foram arrastados pelo maldito Ulisses da terra dos Lotófagos.
Sou filho de uma mulher humana que não pode resistir aos encantos de Morpheu que se disfarçou então de Bicho-Preguiça...
E então meus netinhos verão seu avô dormir de repente,
pois sofrerei de narcolepsia depois de velho.
E rezarão todos os netos,
implorarão a Deus por uma vida tão venturosa quanto a de seu avô.
E o Senhor, em sua Bondade e Misericórdia, não haverá de recusar!

domingo, 9 de dezembro de 2007

Milhares, sim, eu disse milhares de leitores pedem mais informações sobre a fascinante Copa do mundo de 1354 a.C citada no post anterior. Infelizmente, boa parte destes leitores é imaginária. Para dizer a verdade, a totalidade deles. Mas como diria Leibniz, os possíveis possuem também alguma realidade. Enfim, vamos à Copa:


Participaram da Copa do Egito oito países divididos em dois grupos de quatro. Os campeões de cada grupo enfrentar-se-iam na final. Haveria também disputa de terceiro e quarto lugares.

Grupo A
Egito
China
Elam
Maia

Grupo B
Hititas
Babilônia
Grécia Micênica
Assírios

Os jogos:

Primeira Rodada
Grupo A
Egito 12 x 1 China
A maior goleada de copas do mundo de então. E logo na abertura! Esta é a maior goleada até hoje numa abertura de Copa do Mundo. Este placar elástico só foi superado na copa de 808 no jogo Império Bizantino 16 x Lombárdia 0.

Elam 0x 2 Maia
Uma grande zebra! A estreante Maia derrota os já tradicionais Elam num jogo mágico! Atuação memorável do goleiro maia Tikal.


Grupo B
Hititas 2 x 7Babilônia
Rapaz, esta copa foi, sem dúvida, uma das mais surpreendentes. Até o início da copa os Hititas eram considerados os principais rivais do Egito para a conquista da taça e foi escalada como cabeça-de-chave de seu grupo. Já a Babilônia, embora tradicionalíssima vinha fazendo feio nas últimas copas e portanto estava desprestigiada. E no entanto! Uma goleada para os babilônios.

Grécia Micênica 6 x 1 Assírios
A primeira rodada terminou com uma média de 7,75 gols por partida, altíssima, mesmo para os padrões da época.


Segunda Rodada:

Egito 5 x 1Elam
China 4 x 3 Maia

Com esses resultados o Egito praticamente assegura uma vaga na final. Os maias precisam vencer os anfitriões por oito ou mais gols de diferença!

Hititas 2 x 4 Grécia Micênica
Babilônia 1 x 3 Assírios

E os Hititas, então cabeça-de-chave, são os primeiros a serem eliminados no grupo B. A Grécia Micênica depende de um empate contra a Babilônia para assegurar sua classificação. Já a Babilônia tem de vencer por pelo menos dois gols de diferença. Os assírios precisam de uma combinação astronômica de resultados.

Terceira rodada
Egito 3 x 0 Maia
China 4 x 11 Elam
O Egito se classifica sem dificuldades, como era o esperado. O Elam se classifica inesperadamente para a disputa do terceiro lugar. A China notabiliza-se pela pior defesa da história dos mundiais: Média de 8,6 gols sofridos por partida.


Hititas 5 x 2 Assírios
Babilônia 2 x 4Grécia Micênica
A Grécia se classifica e a Babilônia, apesar da derrota, consegue uma vaga para a disputa da terceira posição.

Classificação dos grupos:
1Egito 9p 3v 0e 0d 20gf 2gc +18sg
2 Elam 3p 1v 0e 2d 12gf 11gc +1sg
3Maia 3p 1v 0e 2d 5gf 7gc -2sg
4China 3p 1v 0 e 2d 9gf 26gc -17sg

1Grécia Micênica 9p 3v 0e 0d 14gf 5gc +9gf
2Babilônia 3p 1v 0 e 2d 10gp 9gc +1gf
3Hititas 3p 1v 0e 2d 9gf 13gc -4gf
4Assírios 3p 1v 0e 2d 6gf 12 gc -6gf

Disputa do terceiro lugar:
Elam 4x 4 Babilônia
A Babilônia abriu dois a zero, o Elam empatou. A Babilônia abriu 4x2 e o Elam empatou novamente! O resultado provoca um segundo jogo! Haja coração!

Segundo jogo da disputa do terceiro lugar (jogado horas depois do primeiro, para não atrasar a final que ocorreria no dia seguinte):
Elam 8x4 Babilônia
E depois de cento e oitenta minutos jogando no deserto o Elam vence pelo cansaço.O selecionado babilônico começou melhor e abriu 3x 1 logo no começo da partida. Mas essa correria inicial aniquilou o time e possibilitou a virada e goleada elamita. Além da terceira posição o Elam termina como melhor ataque da competição, ao lado do campeão Egito. O curioso, porém, é que eles marcaram apenas um gol nas duas primeiras partidas, para depois fazerem 23 gols em 3 jogos!.

Final:
Egito 4 x 1Grécia Micênica
O Egito faz valer o fator casa e fatura a Copa mundial! Veja aí os dados finais:

1Egito 4v 0e 0d 24gf 3gc +21sg
2Grécia Micênica 3v 0e 1d 15gf 9gc +6sg
3Elam 2v 1e 2d 24gf 19gc +5sg
4Babilônia 1v 1e 3d 18gp 21gc -3sg
5Maia 3p 1v 0e 2d 5gf 7gc -2sg
6Hititas 3p 1v 0e 2d 9gf 13gc -4gf
7Assírios 3p 1v 0e 2d 6gf 12 gc -6gf
8China 3p 1v 0 e 2d 9gf 26gc -17sg

Artilheiro: Anshan (Elam) 7 gols (4 contra a China, 1 contra a Babilônia no primeiro jogo e 2 no segundo)

Melhor ataque: Egito e Elam: 24 gols (o Egito, porém, jogou uma partida a menos)
Melhor defesa: Egito 3 gols sofridos
Pior ataque: Maia: 5 gols
Pior defesa: China: 26 gols sofridos. Média de gols por partida: 7,333 gols

De todos os tempos, o cartaz mais legal feito para uma copa do mundo:





1354 a.C. - Antigo Egito




Para quem não sabe, Os Frutos da Terra que elogio em algum post mais abaixo, foi escrito em 1897 e recebeu um acréscimo em 1927. Considero esse acréscimo bem inferior à primeira parte. Eis uma passagem deste acréscimo:

“Parece-me de há muito que a alegria é mais rara, mais difícil e mais bela do que a tristeza. E quando fiz essa descoberta, a mais importante sem dúvida que se possa fazer nesta vida, a alegria tornou-se para mim não somente (o que ela era) uma necessidade natural – mas essencialmente uma obrigação moral. Afigurou-se-me que o melhor e mais seguro meio de espalhar a felicidade em torno de si era dar a imagem dela, e resolvi ser feliz.”

Imaginem então como é a parte original...

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Uma maneira antiga de desacreditar uma teoria rival é tacar-lhe um apelido degradante, com o qual ninguém quer se ver ligado. Na nossa era o apelido preferido é “pequeno-burguês”. Todo mundo se lembra então do dono da mercearia e fica com vergonha de se parecer com ele em qualquer aspecto que seja. Fala-se em crenças pequeno-burguesas, instituições pequeno-burguesas, como se o Zezinho da mercearia, aquele mesmo que quebra quando um novo concorrente qualquer abre na rua de cima, tivesse o poder de criar instituições e crenças. Por exemplo, fala-se da família como instituição pequeno-burguesa, como se tal fosse uma invenção surgida em Connecticut no começo do século XX. A verdade é que a dissolução da família é um evento pequeno-burguês e não por acaso o Zezinho está se separando, não é mesmo? Nada mais natural para um pequeno-burguês o estado de solteiro, onde não há nenhuma obrigação ou responsabilidade, onde se pode desfrutar, livre, leve e solto, o mercado da paquera. No matrimônio o outro é encarado como um ser humano a quem estamos ligados por laços indissolúveis e sagrados. Desrespeitar tais laços é degradar não só o seu cônjuge, mas também a si mesmo. Já na solteirice o outro é só um objeto de prazer que está disponível para consumo. Avalia-se o seu custo, o prazer que ele proporcionará e decide-se pela aquisição do mesmo ou não. Foge-se de todo compromisso. Gosta-se de uma pessoa como se gosta de um sabor de sorvete. Eu gosto muito de sorvete de chocolate, mas por que iria assinar um acordo em que eu só poderia comer sorvete de chocolate pela vida inteira? Mais ou menos o mesmo é pensado sobre o casamento, gosto muito da Marina, mas por que eu iria querer assinar um contrato em que eu só poderia comer ela pelo resto da minha vida? O sentimento é trocado pela sensação, o ser humano é transformado em mercadoria, nada mais pequeno-burguês que isso. Outra coisa falsamente tachada de pequeno-burguesa é o eurocentrismo, como se “bárbaro” fosse uma expressão inventada na Inglaterra vitoriana. Em verdade o relativismo é pequeno-burguês e defendido por nove em cada dez pessoas-comuns em nossa era pequeno-burguesa. O sujeito é capaz de, sem corar, defender os mulçumanos e atacar aquele jornal dinamarquês, ou então de defender aquela tribo africana que mutila o clitóris de suas mulheres e, ao mesmo tempo, criticar a Igreja Católica por esta condenar o uso da camisinha e tudo isso em nome do mesmo princípio: o relativismo. Em verdade o que ele diz é: “È claro que eu acho ruim a Igreja Católica dando pitaco na minha vida, ainda que sejam apenas recomendações. Há pouco tempo ela quis censurar aquele filme do Godard. Que absurdo, eu perder um filme por conta de tradições caducas da minha sociedade! Quanto às africanas castradas, que se fodam. Não sou nem africano nem mulher mesmo. Absurdo seria eu tentar libertá-las e arriscar a minha vida sem nada em troca por isso” Individualismo extremado, a principal característica pequeno-burguesa. O relativismo nada mais é que o individualismo extremado, o não se deixar influenciar por nada, o querer que sua tese seja equivalente a todas as demais, independente do mérito que ela possa ter, é o defender uma tese, não por amor a verdade, mas por simples vaidade pessoal.
Por que todo mundo critica o capitalismo? Por que se continua a criticá-lo depois que a experiência nos mostrou ser esse o sistema que produz os melhores regimes políticos, os mais ricos, os mais poderosos, os que permitem a maior liberdade de seus cidadãos? A resposta já está na pergunta. Odeia-se o capitalismo justamente por este possibilitar uma grande liberdade a seus cidadãos. Ele expõe nossa mediocridade. Ele nos permite fazer o que quisermos e não conseguimos imaginar nada melhor do que sair para um bar, beber umas garrafas de cerveja, deitar na cama, olhar para o teto, ficar pensando se compramos uma TV de plasma, se trocamos o carro... Quem pode suportar isto? Muito melhor um regime tirânico que leve a culpa por nossas limitações.
Lá pelo meio do ano li Os frutos da Terra de Gide. Gostei muito. Melhor livro que li esse ano. Comprei outro dele: Pântanos. Odiei. Pior livro que li esse ano. Agora estou lendo Foster, Aspectos do Romance. Em determinada parte critica Gide: “O romancista que denuncia muito interesse por seu próprio método, nunca poderá ser mais do que interessante: desistiu da criação da personagem e nos convocou para auxiliá-lo na análise de sua própria mente, resultando numa queda acentuada no termômetro emocional”. Os frutos da Terra se salva pois é poesia, o autor narra sua viagem de três anos descrevendo frutas, jardins, paisagens marítimas, noites com mendigos, provas da existência de Deus. Não há história, o que une o livro é antes um certo estado da alma. É um livro-música. Já em Pântanos há uma certa história, ou antes, um feixe de acontecimentos, ele não pode se livrar totalmente do enredo ao mesmo tempo que o despreza descaradamente.

Enfim, era só isso. Obrigado, volte sempre.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Viagem a Darjeeling (2007) - 9.3

Dá vontade de ver de novo só para ficar observando os detalhes que não encontrei na primeira vez. Filme bem-feito da porra. Fazendo troça do que há de mais sério no mundo, como todo bom humor, já nos disse Millôr.
Terminei ontem “A marca humana” de Philip Roth. É bom, te prende, são 450 páginas que li numa semana que fazia várias coisas para a faculdade. Porém, enquanto lia, achava a história forçada demais. Os acontecimentos ali narrados se iniciam com o seguinte episódio: Coleman Silk, professor de línguas clássicas numa faculdade da Nova Inglaterra chamada Athenas, ao fazer chamada para uma de suas aulas, já lá para o meio do semestre, nota que dois dos nomes na lista nunca apareciam em sala de aula e faz então a pergunta fatal: “Alguém conhece essas pessoas? Elas existem mesmo ou será que são spooks?” Spooks, termo intraduzível, tem dois significados: espectro, aparição ou então uma gíria antiga para designar os negros. Assim, a frase talvez quisesse insinuar (se a deformamos um pouquinho, como sempre podemos deformar as palavras que foram ditas): eles são estudantes mesmo ou são esses negros que passam com cotas e depois não agüentam o ritmo da universidade? Ocorre que os dois alunos em questão são negros, ficam sabendo do caso e movem uma ação universitária por conta do ocorrido. Os outros professores preferem não interferir no caso, ou então apoiam explicitamente os alunos, seja porque pegaria mal ajudar alguém acusado de racismo, seja por razões meramente políticas, e tudo acaba se caminhando para uma pequena tragédia. Enfim, achava que esse começo era meio estranho e ninguém poderia de fato ter sérios problemas com essas coisas, ou que tal só ocorreria numa nação tão estranha quanto os Estados Unidos, que isso não tinha nada a ver comigo ou com o Brasil. E então quando já estava quase terminando o livro ocorre isto: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u348819.shtml . Aquela velha história, a vida imita arte. Sim, estou mais uma vez criticando o meu tempo. Estou cansado de vocês, meus contemporaneozinhos medíocres. Blergh!

sábado, 24 de novembro de 2007

O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford (2007) - Nota: 8.1

Excelente texto. Foi o texto, sobretudo, que me impressionou. Depois as imagens muito boas, o ritmo lento e certo das imagens, como se tivéssemos acabado de acordar, as excelentes atuações... E o começo! O começo é fantástico, os primeiro quinze minutos me lembravam Sergio Leone. O clima poético e bandido de Isaac Babel em A cavalaria Vermelha. Mas depois... me lembrou aquele péssimo Estrada para Perdição, com o Tom Hanks, sabe? O filme é longo, muito longo, algumas cenas desnecessárias. O ritmo lento das cenas ajuda a alongar ainda mais o filme e no fim já se está cansado, querendo que tudo acabe. Mas é bom, não só o começo, o começo é a melhor parte, mas ainda há coisas muito boas ali pelo meio. Vá num dia em que estiver disposto, são três horas, meu amigo, três longas horas dessa mistura de Era uma vez no Oeste e Estrada para Perdição. Mas o fim, meu Deus, que fim ruim. Não propriamente o fim, mas o prólogo. Consegue ganhar do último Senhor dos Anéis, de arrastado e bobo. E não te convence. Você fica pensando o porquê dessa revolta toda com a morte de Jesse James, do arrependimento de Robert Ford, de seu irmão, aquelas cenas maçantes no teatro; é tudo absolutamente ininteligível (pelo menos para mim que não conheço Jesse James), não convence. Nada ali convence. Não se precisava daquilo, os vinte trinta minutos finais. Jesse James morreu, levante-se, saia do cinema e consiga salvar um bom filme.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Hoje fui à PUC do Rio de Janeiro, passeei por sua biblioteca com livros comentando o Evangelho de São Lucas e vi um quadro com os horários das matérias do curso de teologia, com disciplinas sobre a Epístola aos Hebreus, seminários sobre os prenúncios do Novo Testamento no Antigo, estudos sobre o Concílio de Trento, sobre a questão da Santíssima Trindade e fiquei imaginando que teologia deve ser um curso legal. Sim, falta um parafuso na minha cabeça, nem sou cristão nem nada, porque iria querer aprender essas coisas? Não sei, mas é fato que há um tempo me interesso por isso. Gosto, porém, apenas do catolicismo roots, mais conservador possível, do tipo que acha que mulher de mini-saia é melhor que mulher de calça (eu também acho, mas creio ser por motivos diferentes), que diz que fora da Igreja não há salvação, que defende a Inquisição e as Cruzadas. Lembro agora de Mencken, ateu militante, analisando porque tanta gente inteligente acreditava em algo tão evidentemente falso. Ele concentra a sua atenção no catolicismo e conclui que é por conta da beleza desta religião. Confessava, por exemplo, sentir um certo prazer estético, mas nada místico, ao assistir uma missa. Mencken, porém, escreveu nos anos 20 e 30, período pré-Vaticano II. Já a minha geração cresceu vendo missa com palmas, ondas mexicanas, musiquinhas tocadas em pianos toscos, a melodia com um certo quê de axé music, com padres fazendo sermão sobre como devemos ter cuidados no trânsito ou como os Sem-Terras são o Novo-Povo-Escolhido-De-Deus. Não há cristão que agüente! É absolutamente impossível ser católico nos dias de hoje. Missa em latim com o padre virado de costas deve ser muito mais interessante e bonito, ou pelo menos mais misterioso e charmoso. Estimulo o catolicismo, como ficou claro aí no post sobre vegetarianismo, como está ficando claro neste post. Acho um erro bonito e como nessa vida só o erro é possível, errar bonito já é uma coisa e tanto. Por isso fiquei feliz com o Motu Proprio de Bento XVI. Provavelmente, por achar o catolicismo bonito queria estudá-lo também. Há muito mais beleza em São Tomás que em Spinoza e muito mais beleza em Spinoza que em Nietzsche. E, por Deus!, beleza não é coisa pouca, quantas vezes fui tentado a crer em São Tomás só porque era tão bonito. Mas o cristianismo é um erro, claro. Não faz sentido. Se Deus queria se revelar porque não o fez de maneira aberta, clara e inequívoca? Se não revelou de maneira aberta, clara e inequívoca, com que critérios ele espera que nós escolhamos a religião certa? Com que critérios espera ser justo ao punir uma criatura por não ter adivinhado a religião verdadeira? Alguém que pesquise sinceramente sobre o assunto e não chegue à conclusão alguma seria mais culpável que alguém que nunca pesquisou sobre tal, mas teve a sorte de nascer numa família com a religião certa e seguí-la irrefletidamente? Quando vejo um cristão se defendendo de argumentos dos agnósticos e dos ateus sempre imagino Deus como uma dançarina erótica no seu jogo exasperante de mostrar-e-esconder-mostrar-e-esconder. Seria a vida um strip-tease de Deus? Não faz sentido. Nietzsche e Spinoza fazem. Claro, você pode ser um católico light, que não crê que a descrença nos leva ao inferno. Mas aí já não estamos no catolicismo roots, tomista, que é o mais bonito de todos e então não tem mais graça.

domingo, 18 de novembro de 2007

As mulheres bonitas, na maioria das vezes, são mais inteligentes que as normais ou as feias. Porém, como não recebem nenhum tipo de descriminação, como todos os homens as escutam benevolentes, prestando muita atenção, rindo de qualquer besteira que falem, elas, coitadas, não conseguem formular nenhuma distinção entre aquilo que vale a pena ser dito e o que não vale. São capazes de falar durante horas sobre, sei lá, os cachorros delas, sem desconfiar do quão caceteado estamos. Não importa o quão inteligentes elas são, suas conversas são sempre maçantes e provocam dores nos músculos que nos fazem sorrir.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Para que vocês tenham idéia do meu sofrimento

Quarta-feira última, aula de Deleuze e Bergson:

Professor: “É preciso ir buscar o impensável do pensamento” – olhos arregalados, expressão de quem está extasiado com suas próprias palavras – “compreende?”

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

A independência do Brasil tem sido interpretada de duas maneiras: 1) Um acontecimento heróico e grandioso, dia mais importante e decisivo do país, conquista da liberdade, etc; 2) Uma barganha vergonhosa que não passou de um jogo de encenação, que deveríamos ter lutado para nos tornarmos mais independentes, etc. Ninguém, contundo, parece ter atentado para a interpretação mais óbvia: a independência do Brasil foi uma simples e grande burrada. Seria muito melhor se tivéssemos continuado colônia de Portugal por muito tempo ainda, ter se libertado só lá pelo meio do século XX ou mais tarde ainda. Talvez ainda devêssemos ser colônia. A verdade é que Portugal é um país bem chinfrim, uma metrópole das mais medíocres e trezentos anos não bastaram para nos civilizar. Porém, nossos vizinhos latinos americanos se libertaram antes da hora e decidimos fazer o mesmo, só para não nos passarmos por frouxos ou incapazes. Não tínhamos, entretanto, instituições ou qualquer experiência de autogoverno. Quando da independência, não interessava à nova classe governante criar instituições e leis. Era melhor deixar tudo correr ao gosto de destino, ficar atento e saber entrar no ritmo se aproveitando ao máximo das ocasiões. Esta é a nossa tradição, nossa filosofia política. Contudo, mimetizando as formas antigas e estrangeiras de governo, criamos as tais instituições e leis, apenas pro-forma, claro. Ninguém se lembra delas no decorrer dos anos e, ainda assim, basta que haja algum interesse para as trocarmos, o que ocorre no mais tardar em intervalos de 20 em 20 anos. Ainda não entendemos o que é o governo, a democracia, a liberdade, a cidadania e estamos longe de formular qualquer tipo de pensamento ou projeto quer político ou nacional.

Gabriel, um colega meu dos tempos de escola, dizia que, se presidente do Brasil, suas duas primeiras ações seriam 1) dissolver o exército brasileiro 2) declarar guerra aos Estados Unidos. Seu objetivo era que os norte-americanos conquistassem o nosso território com o menor custo possível de vidas humanas. Acho que uns cem anos como colônia dos Estados Unidos devem bastar. Sim, devemos engolir o nosso orgulho e reconhecer que este é o plano político tupiniquim mais sensato, ou melhor, o nosso único plano político sensato.

Gabriel, você tem um eleitor.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Tenho alguns colegas vegetarianos, mas nunca cheguei a ser amigo de um. O máximo que consegui foi me tornar amigo de ex-vegetarianos que largaram mão de frescura. É fácil entender o porquê. Se eu fosse um vegetariano ético, se acreditasse que comer um animal é tão errado quanto comer um ser humano, nem cumprimentaria um carnívoro como eu.
Seria mais ou menos como cumprimentar um canibal. Quer dizer, cumprimentar um canibal envolve certo risco de vida que não existe na relação vegetariano – carnívoro. Seria então como cumprimentar um canibal que jura só comer carne de japonês, por ser mais saborosa. Não dá para encarar como simples exotismo. Isto é monstruoso e ponto.

Aulinhas de inglês, vocês sabem, aquele papo furado todo. Há quatro ou três anos tive uma aula em que fomos estimulados a fazer um debate sobre vegetarianismo. Apresentei como argumento que the meat is so delicious that would be a stupidity not to eat it. Mas não aceitaram o argumento, não sei porquê. Ora, acho que a carne de certos animais é tão gostosa que o prazer que ela me proporcionará é maior do que o valor da vida do animal em questão.

Sim, dou pouco valor à vida dos animais. Sou um especicista irremediável. Mas valorizo um pouquinho sim. Lembro de um jantar onde, já satisfeito, queria jogar fora uns pedaços de carne que sobraram no meu prato. Meu pai, porém, me proibiu. Disse que um animal morreu para que eu me alimentasse dele e eu agora jogaria sua carne fora, desprezaria o seu sacrifício. Bem, talvez ele só estivesse puto por eu querer desperdiçar a parte mais cara da janta. Anyway, aceitei o argumento e levo-o no coração até hoje.

Agora me deixem desvalorizar a vida animal um pouco. Um dos livros que mais me marcou foi “A vigésima quinta hora” de Virgil Gheorghiu. Chama-se assim, pois o autor entende que estamos na vigésima quinta hora do dia, ou seja, o dia já acabou, não há nada a fazer além de assistir e chorar. Por aí você imagina o tom apocalíptico do livro. Ele foi escrito em 1949 mas a história do livro só vai acabar em 1951, com o início de uma terceira guerra mundial. Em certo momento o autor explica seu pessimismo: a civilização estaria apoiada sobre três colunas: o amor à verdade herdado dos gregos, o governo sob leis herdado dos romanos e a valorização incondicional da vida humana herdada do cristianismo. A história do século XX foi a ruína destes três pilares e conseqüentemente da civilização. Sempre que penso nisso não posso deixar de concordar com o autor. E é aí que começo minha crítica ao vegetarianismo. Ele é um efeito colateral da desvalorização da vida humana. Ele inexiste em períodos de saúde da civilização. Se disséssemos a alguém do século XVII que matar uma galinha equivaleria a matar um ser humano ele riria, porque esta é a única coisa sensata a se fazer diante de tal declaração. Os vegetarianos talvez se defenderão dizendo que não se trata de uma desvalorização da vida humana, mas de uma valorização da vida animal. Besteira. A vida animal não vale muita coisa. Os animais são pura natureza e a morte faz parte da natureza. Ninguém sofre com a morte de um animal. No entanto, se o jornal noticia o assassinato de um homem que nunca vimos mais gordo temos um evento lamentável. Reconhecemos no homem algo superior, que não deveria morrer. Esse algo maior não está na natureza, não está nos animais. É essa crença em algo maior que chamo, com Gheorghiu, creio eu, de valorização incondicional da vida humana. Não venha querer transferir essa valorização para a vida animal: é simplesmente forçar a barra. Ninguém sensato lamenta o veado capturado pelo leão, porque isso é natural. No entanto, todos lamentariam um ser humano capturado por um leão, ainda que tal seja também natural. A resposta, como já apontei, é que o lamentável aqui está num outro plano que o natural, plano esse em que os animais ficam do lado de fora, chupando o dedo da pata. O que os vegetarianos fazem ao dizer que devemos parar de comer carne é algo como “nós seres humanos não valemos mais que os animais, logo, visto que não nos matamos, não os devemos matar”. O problema é que se você tira o valor incondicional da vida humana, a conseqüência lógica não é o vegetarianismo, mas a legitimação do assassinato.

Há ainda outro ponto: imaginamos que todos os leões do mundo parem de comer carne. Isso acarretaria no aumento de número de zebras e veados e, provavelmente, num decorrente desequilíbrio ecológico. Agora imaginem se 6.000.000.000 de pessoas parassem de comer carne. Iria ser o caos ecológico absoluto. A morte dos animais para alimentação sempre esteve entranhada no equilíbrio ecológico do planeta, e a nossa alimentação não está de maneira alguma excluída desse processo.

E ainda temos o problema econômico: milhões de trabalhos estão ligados diretamente no consumo de carne.

Enfim, como meu bife com prazer e em paz com a consciência.

sábado, 10 de novembro de 2007

Uma verdade metafísica

Deus não tem modos.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Lula deu umas entrevistas por esses dias e, obviamente, falou besteiras do tipo “gás gaseificado”. Mas o que mais me irrita nas falas do presidente nem é essas bobagens. O que me irrita são frases como: “ Eu penso que o Brasil não pode brincar com uma coisa chamada democracia". Meu Deus! Porque ele não falou simplesmente “Eu penso que o Brasil não pode brincar com a democracia”? Seria uma frase um tanto acaciana, mas, ainda assim, bem menos ridícula. Para que esse “uma coisa chamada” ? Isso é coisa de gente que não lê e acha que intelectualidade é isso, falar complicado, todo pomposo “uma coisa chamada”. Isso é tão ridículo que, por si só, já deveria bastar como motivo de impeachment e perda dos direitos políticos.

E só para registrar:

“O lula é um peemedebista.” Diogo Mainardi.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Edgar, meu orientador, disse que a família Brunswick queria um livro sobre sua história e incubiu Leibniz de escrevê-lo. Eles sustentaram o Leibniz por três anos, durante os quais ele viajou pelo interior da França e Holanda, teoricamente pesquisando a história da respeitável família. Leibniz, porém, escreveu apenas o primeiro de uma série de livros que ele pretendia escrever sobre tal família. Detalhe importante, o livro discorre tão somente sobre a formação geológica do planeta Terra.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Pensem em Guided by Voices, Weezer, Beck, PJ Harvey, Pixies, Sonic Youth, Nirvana, Pavement, Flaming Lips, Superchunk, Smashing Pumpkins, Bjork, Blur.

Agora pensem em Interpol, Strokes, White Stripes, Sigur Rós, Libertines, Kaiser Chiefs, Arcade Fire

É impressão minha ou há uma mudança de perfil entre os músicos das bandas de rock dos anos 90 e as do começo do milênio? Acho que seria amigo dos músicos dos anos 90, mas não do dos anos 2000. Os noventistas eram mais relaxados, vestiam roupas que todo mundo veste e quase não se diferenciavam das pessoas comuns. Não queriam ser um grupo identificável, como são os emos e os rappers hoje, ou já foram os punks e os góticos. Já os bimilenaristas fazem exatamente isso, se vestem de um determinado modo, são uma espécie de emos pretensiosos. Nos anos 90, a pretensão era a última coisa com que os roqueiros queriam estar ligados. Tenho a sensação que os músicos dos anos 90 tocavam por prazer, e os dos anos 2000 tocam por pretensão artística.

Não. Ainda está confuso, deixem-me explicar melhor. Pensem, por exemplo, no Radiohead. Sem dúvida, musicalmente, uma das bandas mais pretensiosas dos anos 90 e 2000. Porém, você olha para o Tom Yorke e ele parece ser um cara gente fina que cumprimenta, ainda que apenas de longe, os fãs na rua. Se eu contasse uma piada meio sem graça para ele tenho a impressão que sorriria por educação. Agora pensem nos Strokes. Os caras tocam um rock garageiro, sem muita pretensão. E, no entanto são muito mais posudos que os músicos do Radiohead. Se contassem uma piada sem graça provavelmente fariam um comentário sarcástico. Enfim, Strokes são rockstars. Dificilmente diríamos o mesmo do Radiohead.

- Mas João Paulo, que importância tem isso? O que importa é se a música é boa ou não.

- Sim, eu sei. É verdade. Foi só um comentário aleatório

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Daniel (pronuncia-se em inglês, please) me indicou este site: http://hps.infolink.com.br/paulofrancis/paulo.htm . Há aí vários artigos de Paulo Francis. Leio que ele lia livros de 600 páginas num dia. Meu primo leu um de 300 numa manhã. Para mim isto é absolutamente impossível. Esses dias li umas 35 páginas de Mann e achei muito. Sim, sou um filisteu semi-analfabeto. O que ocorre? Se não gosto de um livro a leitura se arrasta por motivos óbvios. Mas se gosto, então leio até terminar o capitulo e depois fico andando de um lado para o outro do meu quarto, pensando naquilo, vou na cozinha bebo um gole de água, volto, fico andando, maravilhado. Não consigo continuar a ler até meu êxtase acabar. Acho que é um resquício de epicurismo literário, um modo de se prolongar o prazer, como quem deixa a parte com creme do pão doce por último. Então vou, escuto um cd, como algo, tomo banho, relaxo, volto para a leitura.

Bem, enfim, um post de merda, mas com um link bom. Provavelmente a melhor coisa que já fiz neste blog.

sábado, 27 de outubro de 2007

Em que conto uma história e tento explicá-la contando outra história

O governo de um dos países de Petis Adolu, se não me engano o Brpudl, decidiu que toda verdade era uma forma de opressão. Depois de algumas discussões decidiu-se por criar um parlamento que promulgaria todas as verdades do mundo, tornando-as, assim, instrumentos das vontades dos povos. A questão “Quanto é 1+1” foi a primeira a ser votada e deu muita polêmica. O senhor Rldnpeit Pzlvlit logo disse “ué, dois”. Não demoraram a aparecer os mais exaltados, quase berrando, explodindo em perdigotos e indignação:
- Ó sim, senhor sabe-tudo, senhor como-é-simples-a-reposta-de-1+1, Ó sim, é dois, ué... Seu hipócrita! Seu opressor! Querendo sufocar nossa liberdade nossa criatividade com verdades inventadas para calar a boca do povo humilde, trabalhador, desse povo que trabalha tanto que não tem tempo de pensar por si próprio e então vem vocês com essas respostas prontas “ué, é dois”. Ora meu senhor...
- Sim, meus senhores, -interrompeu um outro, ainda mais veemente - mas este aí não é nosso único opressor. Infelizmente vários de nossos professores têm essa mesma mentalidade mesquinha, tacanha, cruel. Meu filho tem a infelicidade de ser aluno de uma professora da estirpe desse aí... Respondeu que 1+1 era onze numa prova e recebeu um zero. Meus senhores, quando é que aprenderemos a ouvir o próximo, a sermos mais tolerantes, a enxergamos um mundo mais colorido e feliz, e não apenas o certo e o errado, o preto e o branco. Sim, pois...
- È importante lembrarmos aqui – retomou o primeiro - de nosso povos ancestrais que não conheciam a matemática nem nada. Para eles, desapegados do material, pouco se davam quanto era um mais um. A matemática é o instrumento capitalista para regulamentar e ordenar os povos.
- Quando vejo o senhor falando – retomou o segundo se aproveitando de um breve respirar do primeiro – “ué, dois” com toda a sua empáfia, sou penetrado por ódio, sim, por ódio, pois olho para o senhor e lembro-me de toda a opressão que nosso povo sofreu na mão de pessoas como você. A questão de quanto é 1+1 é bastante complexa, bastante perigosa, ainda vou para casa estudar os laudos, mas não posso aceitar que dois seja a resposta. Dois é o continuísmo com tudo o que está aí, nos governando há quinhentos anos. Eu proponho que votemos esta questão e que a resposta do meu brilhante, porém censurado filho seja aceita. Onze é a voz das crianças, onze é a voz do futuro, onze é um mundo novo que se nos descortina, onze é a alegria de descobrir e encarar o novo. Enfim, o onze é tudo de bom.
A questão foi à votação, discursaram alguns defensores do dois, outros do onze. Conversas das lideranças dos partidos nos bastidores foram armadas e chegou-se a um consenso que seis virgula cinco era uma resposta melhor, que atenderia as duas posições. A questão foi então a julgamento e a maioria decidiu que era mais acertado mesmo o seis e meio, que não era necessário todo esse radicalismo. Houve alguns que se manteve firmes no dois, mas foram tratados por todos, daí em diante, com absoluto desdém, como políticos muito ruins, cabeças-duras intratáveis.




Imaginem um grupo de crianças, todas encapotadas, subindo despreocupadamente uma montanha coberta de neve e puxando um trenó. Elas atingem a altura desejada e deixam-se levar, felizes, pelo trenó. Enquanto descem, não há o que fazer, é impossível parar o trenó. É necessário que desçam. Mas a questão é que elas não querem parar o trenó, elas querem a necessidade. Elas sobem despreocupadas, certas da necessidade da recompensa de seus esforços e descem felizes por suas vontades estarem de acordo com as regras que regem o mundo.
Bom Senso: Ruinzinha esta sua teoria apresentada aí abaixo, não?

João Paulo: Explique-se.

BS: Bem, você sabe, a civilização traz conhecimento, o conhecimento traz poder, o poder tende naturalmente a se expandir, e, em conseqüência expande-se a civilização. O poder não é ruim, em geral é bom. Tome, por exemplo, o Império Romano. Civilização: expandiu-se naturalmente. Seu aumento do poder consistia em que? Mais conhecimento, mais civilização. Quando os bárbaros o destruíram não pode ser mantida nenhuma unidade. Não havia poder para isso, não havia conhecimento e não havia civilização. A união e o decorrente fortalecimento do poder tende a civilizar as partes bárbaras. Mais, é preciso poder para garantir a liberdade. Os romanos eram mais livres que os bárbaros.

JP: É, você tem razão.

BS: O problema, parece-me, é que o conhecimento é neutro: pode ser usado para o bem e para o mal. O nazismo e o comunismo só foram possíveis dado um acúmulo de conhecimento. Nenhum bárbaro conseguiria o poder de Stálin ou Hitler. O conhecimento é fruto da civilização, mas pode a destruir também. E então, quanto mais poder, pior. Não faço a menor idéia de como controlar isso.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Não sei bem quando foi que o mundo morreu, mas ali por volta de 1865 e 1871 foram batidos os últimos pregos no caixão. Nos EUA Lincoln ganhava a guerra, fortalecendo a união norte-americana e enfraquecendo o antigo federalismo. Na Europa os estados da Alemanha e Itália eram criados e o conceito de estado-nação atingiu seu cume. Daí para movimentos internacionalistas como o comunismo, a União Européia e a ingerência da ONU foi um pulo. Uma pena. Bom mesmo era nos tempos dos pequenos feudos ou das cidades-nações. O poder deve sempre se manter pequeno, cambada. Mas ninguém me ouve. Pensa só: Hitler não existiria se a Alemanha nunca tivesse se unido. Mas por medo fizemos tudo errado. É assim mesmo, o medo é o pai do mal, já nos dizia Aristóteles e Mestre Yoda. A humanidade tem mesmo essa vocação para servidão e não pensará duas vezes em vender sua liberdade por segurança.

domingo, 21 de outubro de 2007

Estudo Leibniz porque quero entender os desígnios divinos. É que desisti de entender os femininos.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Por Sarkozy, contra o DEM

No Roda Viva de alguns meses atrás, Rodrigo Maia, líder nacional do DEM, disse que Sarkozy ganhou a eleição francesa por sua clareza em se posicionar como de direita e conservador. Indagado por um jornalista do porquê o DEM não fazer o mesmo no Brasil, ele disse que por cá não há espaço para um conservadorismo puro, o povo preferiria um candidato mais de centro, com bandeiras da direita e da esquerda.

Ora, isto foi também um pouco o que o PT fez; saiu de uma posição esquerdista para o centro, hasteando bandeiras que antes queimava. Qual o resultado disto então? Políticos profissionais que fazem o que o povo pedir. Não há espaço para projetos nítidos, implementações de políticas coerentes e menos ainda para a coragem de ser, por vezes, impopular. Ao invés disto temos apenas office-boys do povão, esta massa sem cabeça que não sabe nem a hora que está com fome e que quer decidir sobre complexas questões econômicas. É isto mesmo a democracia, né? Esse reino da mediocridade e da estupidez. Este cenário onde estadistas se expressam por meio de metáforas futebolísticas.

Até admito que pode ser tentador defender esse modelo medíocre de democracia, estas políticas baseadas em pesquisas de opinião, afinal, o século XX nos mostrou que não é divertido brincar com extremos e este modelo é, de fato, a melhor maneira de fugir dos tais extremos. Mas vejamos uma dificuldade típica deste sistema. Alguém do povo ou então um empresário incompetente está enfrentando uma dificuldadezinha qualquer e pensa “hm, o governo bem que podia me ajudar”. Ele então reúne um grupinho de pessoas que está enfrentando o mesmo problema que ele e combina ações e petições. O governo, este office-boy temente de perder o emprego para a oposição (que na prática não lhe é oposta a nada, seria mais acurada chamá-la de concorrência), acaba por aceitar tais pedidos. O grupinho passa então a chamar aquelas esmolas de direitos. E isto ocorrendo em vários lugares, em vários ramos. O governo, é claro, aumenta os impostos, inventa mil maneiras de aumentar seu poderio econômico. Tudo para satisfazer sua freguesia.

É possível um liberalismo neste cenário? Conseguir trazer de volta princípios liberais depois que o esquerdismo sentou no trono é muito difícil. Como fazer para as pessoas perceberem que seus “direitos” são os responsáveis diretos por crescimentos econômico medíocres, por uma carga tributária absurda? Poder-se-ia pensar que a relação entre benefícios-impostos seria balanceada pelo eleitor que pensaria “impostos demais, hora de votar num direitista” ou “benefícios de menos, hora para um esquerdista”. Mas isto não ocorre. Expliquemos isto pela última eleição. Alckimin dizia que era a hora de cortar impostos. Existe algum brasileiro que discordaria desta posição? Mas aí ocorria o óbvio, Lula perguntava: “E que gastos você pretende cortar? Você pretende cortar o Bolsa-Família? Você pretende privatizar estatais ou universidades?” Alckimin, baseado nesta concepção mesquinha de democracia, recuava, dizia que bastava gerir melhor que os gastos diminuiriam e, logo logo, poderíamos cortar os impostos. Nem mesmo o povo, com sua habitual parvoíce, pôde acreditar. O que ocorre? Ninguém discorda que é preciso cortar impostos. “Mas que gastos são esses que você pretende cortar? É o meu salário?” pergunta desconfiado o eleitor. E então o que era um ponto pacífico se dissolve. O resultado é claro: o estado não consegue diminuir, só pode aumentar e, assim sendo, nossa liberdade não pode aumentar, apenas diminuir. Cada vez mais e mais. E o pior de tudo: quanto mais o Estado aumenta, mais sem direção ele fica, cada vez mais e mais controlado pelos inconstantes, irrefletidos e superficiais desejos de uma massa ignorante e amorfa.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Aristóteles, Metafísica, Livro II, Parte I

Ninguém pode fugir da Verdade.
Ninguém pode escontrar a Verdade.

Eis tudo.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Em geral, os jovens mudam de cidade procurando, entre outras, ter novas experiências, amadurecer. Foi assim também comigo, mas tenho de reconhecer: o Rio está me infantilizando.

Por exemplo, ando vendo uma quantidade inacreditável de episódios do Bob Esponja e de um desenho (não sei o nome) que passa no SBT sobre uma garota que tem super poderes e lida com um mundo secreto cheio de monstros, dragões, vilões e burocratas do mundo encantado. Tenho também comido mais biscoitos (escrevo este post comendo Trakinas e tomando coca sem gás) e danetes, tenho estado mais solitário, mais feliz e despreocupado.

O principal, porém, é que nunca estive tão desocupado, tão vagabundo, tão preguiçoso. Creio atualmente que uma vida realmente boa e bela só aceita, se muito, as obrigações auto-impostas. O professor passa textos para ler e eu esperneio, não leio, leio de qualquer jeito, com um dos olhos no computador, na Internet, pensando no meu momento de folga. O trabalho nunca me pareceu tão vulgar. Esses dias tirei um extrato da minha conta corrente e pude observar todos aqueles centavos retirados pelo banco de minha parca fortuna e imediatamente pensei que os banqueiros, tão empoados, tão importantes, não eram menos vulgares que os flanelinhas “aí tio, deixa eu ficar de olho no seu dinheirinho aí? Qualquer dois real paga.” Porém, se o trabalho sempre me pareceu vulgar, trabalhar com filosofia me parecia menos vulgar que o normal. Quão inocente eu era! Poucas coisas são mais vulgares que ler um livro de filosofia, não porque você está interessado naquilo, mas só porque alguém mandou. E iniciar uma pesquisa, escrever um artigo, dar uma aula, só para cumprir com suas obrigações acadêmicas? Meu Deus, isso me parece tão tosco!

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Uma das principais funções de um blog é propiciar confissões constrangedoras e, como se não bastassem as que já postei neste espaço, aqui vai mais uma: gosto muito de “O Pequeno Príncipe” de Saint-Exupéry. Já li três vezes, inclusive. O começo do livro é, talvez, o mais genial de toda história da literatura. Trata-se de um teste para ver se você é uma pessoa legal ou não. Fui reprovado . Mas não ligo e indico.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Tropa de Elite – (2007) – nota: 8.3

Consideremos a cena em que são dadas as más-vindas aos aspirantes ao batalhão do BOPE como a metade do filme. Em sua primeira parte o filme é bem jornalístico, excessivamente explicativo e polêmico. Seria uma ótima coluna de jornal e é um filme médio.

Já a segunda metade do filme é muito boa. Deixa de ser jornalismo puro, há uma intenção, uma história ali. Não é a história do Capitão Nascimento. O Capitão nascimento é na verdade a parteira do grande personagem do filme: Matias.

O filme é na verdade uma história sobre corrupções, como pessoas boas acabam por se corromper pelo meio em que vivem. O grande mérito do filme é a sacada de inverter o clichê. Esta é a justificativa dos bandidos, ninguém pensou em aplicá-las aos policias. A pergunta do filme parece ser: quem não é produto do meio? E por sermos todos produtos do meio agora não podemos mais julgar ninguém?
Quando estive em Curitiba, hospedei-me num hotel que oferecia TV a cabo. Assisti então uma entrevista de um escritor estrangeiro, feita por um jornalista brasileiro; não me lembro em que canal, não me lembro quem era o escritor. Lembro-me apenas que era alguém tachado como “o maior inimigo da juventude”, falava em inglês e já tinha os cabelos brancos. E lembro-me também de sua fala final, não ipsi literis, claro e infelizmente, que não sou maluco. Ele disse que via muitas pessoas de sua idade falando que haviam tido vidas ruins e vazias, que o mundo continuava tão ruim quanto antes. E isto, dizia “o maior inimigo da juventude”, era muito triste. Estas pessoas não haviam compreendido como era bom participar da existência, não haviam compreendido o papel de suas vidas, não haviam compreendido nada.. Isso é triste, pois eram vidas jogadas fora, por um erro de interpretação. A maioria desses velhos pessimistas possuía uma ideologia que não hesitaria em colocá-lo, ele, um homem de direita, numa fogueira; e ainda assim “o maior inimigo da juventude” não conseguia vê-los com raiva, mas apenas com pena. Aquilo ficou na minha cabeça, pois ele está certo, evidentemente. Desde que deixei de ter uma visão esquerdista da realidade, sinto-me uma pessoa melhor e, acho, compreendo melhor a realidade. Tenho meus momentos pessimistas, tristes, eles são normais, eu sei, mas já não acho que eles são a essência da existência humana na Terra, que nossa condição é a da náusea e essas besteiradas todas.

Recentemente Millôr disse uma frase, acho que era assim: “Cada vez mais tenho a impressão de que vivo num mundo onde ser feliz é considerado reacionário”. Na chamada época helênica, as escolas filosóficas disputavam qual filosofia proporcionava aos seus adeptos a maior felicidade. Proporcionar a felicidade sempre foi visto como algo bom, muitas vezes como o único objetivo a ser alcançado. A esquerda, no entanto, inventou uma filosofia que quer se destacar pela tristeza que ela proporciona. Não me lembro mais quem disse que o marxismo captura as pessoas não por sua verdade, mas pelo seu caráter demoníaco e pessimista. Depois do marxismo surgiram várias doutrinas, quase sempre esquerdistas, que possuem o mesmo apelo.

Um esquerdista não pode ser feliz. Um esquerdista é, por essência, um revolucionário. Ele vê nossa situação e o tanto que ela se distancia do ideal, e começa a ter ânsia de mudar tudo. Esta vontade é de fato linda, comovente e tem algo de sagrado. Um comunista é tão revoltado que se dependesse dele não haveria religião, carnaval, novelas, futebol ou qualquer outra coisa que distraísse o povo da revolução. É como se ele dissesse: ninguém tem o direito de ser feliz antes do comunismo, antes do meu ideal. O esquerdista parece não ter capacidade de ver as conquistas da humanidade, e mais importante ainda, parece não ter uma boa capacidade de auto-análise. Ele parece não ser capaz de ver a matéria com que somos feitos. Se ele se conhecesse um pouquinho diria “ei, até que o mundo não está tão mal assim não”. Se ele se conhecesse de verdade diria “apenas um milagre, ou melhor, apenas vários milagres explicam um mundo tão bom”.

A foto mais chocante que já vi está publicada no Livro Negro do Comunismo. Não tinha mais que 5x5 centímetros, era preta e branca e quase não dava para ver nenhum detalhe. Uma legenda ajuda a entendê-la: trata-se de um tenente ou capitão polonês, suspenso de ponta-cabeça, um de seus pés amarrados num galho alto e forte de uma árvore, nu, capado e com um cabo de vassoura enfiado no ânus. E, no entanto, a verdadeira causa da atmosfera demoníaca dessa foto é a turba de revolucionários russos que cerca o pobre polonês. A foto era pequena, mas conclui-se que provavelmente havia uma centena ou mais de homens no local do crime, alguns deles gargalhando. É claro, não se trata de uma coincidência ou de uma providência satânica em que cem psicopatas se encontram por acaso. Esses cem eram pessoas comuns. Esses cem eram aqueles que se julgavam melhor que o mundo e digno de transformá-lo.

O direitista é antes de tudo um anti-revolucionário, ele vê todas as conquistas e pensa “Caramba! Como foi que meus antepassados conseguiram?”. Não raro fica tão embasbacado com estas conquistas que precisa de uns tabefes de esquerdistas iluministas para perceber que há ainda muito a ser feito. Um direitista não quer mudar o mundo. Quer, ao contrário, estar à altura dele, quer mudar a si mesmo, quer fazer parte do que há de melhor. Eles estão atentos às conquistas da humanidade e podem perceber o quanto seria fácil perdê-las. Eles estão sempre com um pé atrás, sempre coçando a cabeça, sempre se dizendo “é, pode até ser que melhore, mas já está tão bom, para que arriscar?” Mais que isso, eles estão sempre a nos perguntar “Como pessoas que capam e empalam outras pessoas, pelo simples prazer de humilhar seus inimigos, podem querer falar de justiça, de igualdade, de liberdade?”.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Uma homenagem ao verdadeiro herói do dia


Parece que em 2006 ele foi operado de catarata por médicos cubanos que, obviamente, não sabiam quem ele era.
Ademg informa: Mário Teran 2x0 Cuba.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Vênus – 2006 – Nota: 7.3

O filme tem um bom texto, um bom começo, um bom final. Mas não é um bom filme.

Se você está fazendo um filme, você é Deus. E um Deus cartesiano. Ou seja, você tem não apenas o poder de criar os cenários, os personagens, as cenas, mas também tem o poder de criar valores morais. Você decide o que é bom e o que é ruim. Eu, aqui, do lado da poltrona, estou esperando a sua catequese. É claro, posso até gostar do filme sem comprar sua moral. Mas só posso gostar de um filme – em especial filmes que não são comédias – que tenha uma moral. No caso deste filme, fiquei com a impressão que o diretor queria apenas narrar uma história fazendo de tudo para fugir da questão moral. O problema é que a história do filme só é interessante por conta do seu problema moral. Essa assepsia torna o filme bastante insosso. No fim das contas não sei se a história é sobre um velho patético e triste ou sobre um velho heróico e feliz. É bem provável que o diretor queria mostrar equanimente os dois lados. Porém, se essa neutralidade é um porre no jornalismo, no cinema é um pecado mortal.
Um detalhe importante que esqueci no post abaixo: uma coisa legal do filme “À procura da felicidade” é que ele narra as desventuras de um negro, pobre, abandonado pelo pai, inteligentíssimo e com poucas oportunidades enfrentando vários obstáculos para se dar bem e, em nenhum momento do filme, discute-se o racismo. Não é fantástico? No entanto, no Brasil, quer em filmes ou em novelas, se um negro aparece é para se discutir o racismo. Eu confesso que sou bastante racista na hora de escolher um filme nacional, vejo um negro na capa de algum filme brasileiro e penso “Ih... Aposto que este filme tem uma temática social ou racial, credo”. Dificilmente pego. Culpa desses cineastas anti-racistas que pensam que ator negro serve só para fazer filmes contra o preconceito racial.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

The Pursuit of happyness (À procura da felicidade) – 2006 – Nota: 8.0

É muito fácil falar mal de um filme como este: 1) um exagerado clima “I´m trying to break your heart”, 2) história-clichê e 3)Will Smith. Mas 1)Dickens também é bem sentimental (tudo bem, não é o tempo inteiro), 2) Uma boa obra pode até ser baseada em um clichê (por exemplo, todos estes livros realistas e suas histórias de adultério), o que ele não pode é espalhar clichês por todas as partes, por todas as cenas - e isso o filme não faz (até tem um ou outro clichê ali, mas pô, todo filme tem direito a uma cota de umas três ou quatro cenas-clichês) e 3)Will Smith está bem no filme, juro; ele não fica sorrindo o tempo todo, nem fazendo piadinhas, nem se dando bem com gatinhas, nem nada dessas coisas que o Will Smith faz em todos os seus filmes.

No geral é um bom filme com algumas grandes cenas. Fica a dica.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Em Memórias de duas jovens esposas de Balzac há um personagem que é preso pelas forças russas durante as guerras napoleônicas e é solto anos depois, mas tem que voltar por sua própria conta para França e fica vagando pelo leste europeu por quatro anos. Parece que tal foi inspirado numa pessoa real. Fiquei pensando sobre este caso e como ele explica a ruindade das artes feitas no Brasil. Nossa história é o cúmulo do desinteressante e do caricato, serve no máximo como cenário para comédias. E no entanto todos querem ser sérios. Pense no estado atual do Brasil, por exemplo. Tudo perdidamente ruim e desgraçado, mas é de uma ruindade e de uma desgraça incapazes de drama. O sublime e o Lula são incompatíves. Outro exemplo, a ditadura militar no cinema. Mais da metade dos filmes nacionais se passam na virada dos anos 60 e 70. Mostra-se a ditadura como se fosse o inferno na Terra, mas a verdade é que foi uma ditadura bem chinfrim. Devem ter morrido mais pessoas em filmes brasileiros sobre tal período que pessoas reais pelas mãos da ditadura. Mas o que se pode fazer? Vai filmar que outro período, pensa só, o único concorrente da ditadura é o Cangaço.

domingo, 30 de setembro de 2007

“O que seria um quarto para nós, Nathanael? Um abrigo numa paisagem.”

Tenho lido livros estranhos e perigosos de viajantes vagabundos e me enamorado mais e mais da idéia.

Num outro livro, em certo momento, o personagem principal se emprega como marujo. Fico pensando se isso é possível hoje. As vezes tenho a impressão de que nos especializamos tanto que até para conseguir um emprego de carregar e descarregar caminhões é preciso experiência.

O problema do trabalho é o tempo. Não é tão ruim descarregar e carregar caminhões. Mas deve ser muito ruim acordar e ter a consciência que se perderá todo um dia carregando e descarregando caminhões.

O problema é que sou um retardado prático, incapaz de instalar um dvd numa tv.

“A delibitação e degeneração da raça humana ele atribui à sua progressiva predileção por interiores e ao interesse decrescente pela arte de sair e ficar fora”.

Desde os catorze anos mudo de vida a cada dois anos. Deveria também mudar meu nome nessas ocasiões.

Um animal selvagem passa toda sua existência sem um nome e não sente falta alguma disso.

Seria legal viajar a pé da Turquia até o Japão, ainda que a viagem terminasse num banho de rio em algum país do Sudeste Asiático.

Por agora é como viajar. Tem seu certo charme, mas falta quanto mesmo para chegar?

Fazer da viagem um passeio, dizia meu padrinho. Será?

Cansei-me da acadêmia. Um trabalho penoso e inútil. Chegou a hora de mudar. Mas quanto mais velho se fica mais difícil mudar.

As pessoas querem empregos fixos. Eu sempre tive medo deles. Dez anos num mesmo emprego, para mim, são dez anos jogados fora. A academia me atraía pois era possível mudar. Dois anos com Leibniz, dois anos com Aristóteles, dois com Kant, dois com Frege, dois com São Tomás. Mas no fundo é o mesmo trabalho difícil e inútil.

Bom mesmo é ser fazendeiro. Meu lado prático planeja o seguinte: trabalhar, juntar dinheiro, construir uma fazenda e então mandar o mundo se fuder. Serei igual aqueles velhos americanos sentados numa cadeira de balanço à porta de suas chácaras ostentando uma velha espingarda de madeira e atirando em todo mundo que desrespeitar minha plaquinha “Keep out of my property, punk”.

Peraí, mas não era para ser o oposto? Sim, era. Agora não sei mais.

Árvores passando, vacas pastando, mulheres e filhos andando à beira da estrada. Quando e onde pararemos para o lanche?

Que fazer além de ler livros, escutar músicas, apreciar paisagem?

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Mulher, teu rosto me destruiu

Nunca me esquecerei do que me ocorreu nesta terça-feira última. Se tenho deixado de escrever aqui é por passar meu tempo meditando sobre o fato e não porque meu computador enguiçou.

Era pouco mais de meio-dia, e estava atrasado meia hora para minha aula. Troco a linha 1 pela linha 2 do metrô carioca. Já não havia lugar para sentar, mas o metrô estava longe de estar lotado. Fiquei de pé, encostado numa parede do metrô. À minha frente havia uma fileira de quatro cadeiras e nelas quatro pessoas sentadas cujos rostos podia ver perfeitamente. Numa dessas cadeiras, a mais próxima de mim, estava sentada uma mulher de cerca de trinta e cinco anos, corpo bonito, vestindo um jeans escuro e uma camiseta rosa. Ela estava cabisbaixa, mas ainda assim pude perceber que seu rosto era deformado, como que amassado, talvez um acidente - uma pena, pois me parecia que ela seria uma bela mulher se não fosse por isto. Desviei o olhar.

Alguns segundos depois, porém, meu olhar foi novamente atraído na direção daquela mulher, porém, surpresa! ela estava agora de cabeça erguida e olhando diretamente para mim. Creio – e desejo do fundo da minha alma que minha crença seja verdadeira – que meu rosto não exibiu nenhuma reação além da dilatação das minhas pupilas – sim pois pude sentir minhas pupilas dilatando bruscamente. Por um segundo não senti nada além de medo. Os politicamente corretos que me perdoem, mas é preciso que se diga com todas as letras: aquele rosto era monstruoso. Não me deteterei aqui na impossível tarefa de descrevê-lo; posso, se muito, traçar paralelos: seu rosto - que era tão amassado que apenas um olho me fitava, enquanto o outro, que ficava mais ou menos na altura entre a boca e o nariz, via os flancos - lembrou-me Picasso. Mas agora, procurando rapidamente por seus quadros no google, não encontro nada que se assemelhe. A única deformação que conheço e parece-me proporcional –embora de natureza diversa - é a do Homem-Elefante. Vê-la no entanto a cores, na minha frente e saber ser algo real...

Tudo isto demorou um segundo, talvez dois. A intensidade do medo que senti, no entanto, fez daquilo um experiência mística. E como toda experiência deste tipo é inútil tentar descrevê-la, mas que você me perdõe. O que há de tão desesperador nesse rosto é que ele tira a humanidade da pessoa. Aquilo pareceu-me o pior destino que conheci, ela a mais desgraçada das almas. Uma maldição, um suplício extremo e intolerável que se faz real a cada segundo – ter um rosto tão medonho que não só causa asco, mas pavor. E ela andava toda pimpona no metrô, cabeça erguida. Não pude deixar de admirá-la. Há heroísmo nisso. Foi como ver um santo agindo, Jó rezando e chorando, uma criança sendo torturada sem soltar um ai, impávida. Ela pareceu-me exibir mais força que um ser humano pode ter.

E ela não fazia nada além de respirar.

sábado, 22 de setembro de 2007

Uuuh! Como fui radicalzinho aí em baixo, hein? Deixem-me corrigir. O que quis dizer é que um governo tão corrupto e com tantos escândalos torna as notícias um tanto entediantes. O noticiário fica tomado por pessoas vulgares. Temas importantes como a criação de uma tv pública tornam-se secundários ante a absolvição de Renan. O resultado é que não há nada de interessante que um ser humano possa achar num jornal brasileiro. Tudo tediosamente previsto e escandaloso. O melhor comentário de tudo isto foi de Mainardi, esses dias. Por quatro anos o povo decidiu que será assim: o governo paga o mensalinho (aka bolsa-família) regularmente e está livre para fazer o que quiser. E assim o PT ajuda a destruir a incipiente democracia brasileira.
Meu computador quebrou, o que explica minha ausência. Não sei quando o consertarei, logo não sei quando voltarei a postar aqui com frequência. Quem me conhece mais de perto sabe que sou viciado em computador. Fico na frente dessa máquina umas seis horas por dias, no mínimo, em geral lendo notícias e blogs e ouvindo música. Pois bem, há mais de uma semana não faço isso e não sinto falta. É uma benção, estou encarando esta situação como uma desintoxicação. Não há nada mais enganoso que essa sede por novidades, este hábito de ler os jornais diariamente. É sempre o mesmo, de novo e mais uma vez. Quem leu jornal por um ano já leu pela vida inteira, assim como quem viu uma novela da globo já viu todas. A realidade - e em especial a realidade política - é construída toda em cima de clichês, essas personlidades vulgares, esses Renans e esses Lulas. Não se interessar pelas notícias é o maior ato de rebeldia que um cidadão poderia realizar.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Ah, o Velho Oeste! Aquilo sim era civilização. Ninguém ousava ir à mercearia da esquina sem um revólver no coldre. Andar armado era um ato patriótico, uma mostra de coragem e de presteza. “Se depender de mim o mal não prevalecerá sem luta”; era o que todos pareciam dizer. Há nessa desconfiança absoluta muita bondade.

Daqui a pouco partirei para UERJ, tomarei um ônibus cheio e dividirei um banco com alguém completamente desconhecido. Estarei desarmado. Há nessa confiança absoluta uma excessiva preguiça e covardia. “Estou sempre pronto para gritar femininamente Polícia! Polícia!” é o que pareço dizer. Como se ser corajoso e bom fosse um trabalho a ser remunerado e não uma simples obrigação moral.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Por que não ler Chomski? Por que ler Burke?

“Esta guerra era inteiramente desnecessária, conforme o testemunho de muitos dos que estão do seu lado. E o mais destacado entre vocês que lhes fala sobre este assunto e sobre a manipulação da opinião pública é Noam Chomsky, que deu conselhos sensatos antes da guerra, mas o líder do Texas não gosta daqueles que dão conselho. O mundo inteiro, de forma inédita, advertiu contra a guerra e descreveu a sua real natureza em temos eloqüentes: 'Não ao derramamento do sangue vermelho pelo óleo negro.”

Osama Bin Laden

“O sicofanta – que a soldo da oligarquia inglesa representou o romântico laudator temporis acti contra a Revolução Francesa assim como, a soldo dos colonos norte-americanos no começo dos problemas americanos, representara o liberal contra a oligarquia inglesa – era uma burguês completamente vulgar”

Karl Marx sobre Burke

domingo, 9 de setembro de 2007

É engraçado como os esquerdistas costumam ser consumistas. Conheci uma garota comunista que certa vez fez a seguinte ressalva: só acreditava num comunismo com Shopping Center.

Ah, e esses diretores e atores americanos esquerdinhas e bacanas? Queriam que os EUA saíssem o mais rápido possível do Vietnã, querem que saiam agora do Iraque. Vêem a si mesmos como pessoas polêmicas e corajosas, crítico dos Estados Unidos, amigos dos povos oprimidos. Depois de 1973, quando os Estados unidos deixaram o Vietnã, até 1978, quando as forças vietnamitas invadiram o Camboja, passando pela tomada de Saigon em 1975, calcula-se que morreram o triplo de pessoas que do período de invasão americana (1965-1973). Mas, vejam só, nenhum desses mortos eram americanos. Então, who cares? Nunca vi um único filme sobre tais episódios.

sábado, 8 de setembro de 2007

Como já dizia o Sly:

“Feel so good inside myself, don't wanna move
Ah, feel so good inside myself, don't need to move”

Vários tentaram provar a existência de Deus pela existência do universo, quando a existência do universo é justamente a prova da inexistência de Deus. Um Deus perfeito é feliz e portanto não precisa de ação ou de obras. Se Deus construiu o mundo então não era feliz e logo não era perfeito.
Nenhuma obra vale o trabalho. Deixo tudo como está. Sou o rei da preguiça. E me sinto bem. Agora me deixem dormir

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

UERJ

- Eu também tentei fazer mestrado na UERJ, ano retrasado, mas quando entrei naquele prédio, para fazer a prova, senti-me mal. Ele é gigante e não se vê uma única planta em parte alguma, apenas concreto nu, sem tinta. Seus corredores escuros, estreitos, infindáveis, segmentados por portões azuis-escuros e velhos, seu chão cinza-escuro, liso e sujo, suas rampas e escadas construídas do modo mais funcional e regular possível, suas paredes com quase um metro de grossura, as portas das salas - às vezes protegidas com grades – têm aquelas janelas que permitem vigiar pelo lado de fora... Aquilo me pareceu uma prisão.
- É a primeira impressão de todo mundo que conheço. Eu mesmo pensei isso quando entrei. Mas depois se acostuma.
- Mas é triste. É triste se acostumar com uma coisa dessas.
A escola atrapalha os estudos. Ao menos a escola na frente da minha casa. Todo fim de semana é a mesma coisa: músicas baianas tocadas no último volume. Não consigo estudar.

Duas questões flutuam em minha mente:
1) Com que autoridade a escola ensinará que não se deve incomodar os outros?
2) Que tipo de educação é esta que estimula seus alunos a ouvirem música de baixa qualidade? Em pensar que na Grécia Antiga os garotos eram educados ouvindo Homero! Homero! E tem uns bocós que acreditam sinceramente no progresso humano. Não seria preferível que estes garotos estivessem na rua, vadiando, flertando com o mundo das drogas e do crime, ao invés de serem deseducados esteticamente de maneira tão grotesca?

sábado, 1 de setembro de 2007

Era 31 de agosto e já fazia um dia que estava sem Internet em casa. Ainda não sabia, mas estava saindo de uma semana depressiva. As forças estavam voltando ao meu corpo melancólico e, sozinho em casa, falava em voz alta que desejava largar o mestrado, tornar-me um marinheiro, içar velas, ficar a mercê de ventos. Meu corpo pedia música, e sem consultar minha cabeça que lia então alguma coisa de Nimzowitch, colocou “My aim is true”. A perspectiva de uma noite entediante surgia em todo seu fulgor. Estava no banheiro, fazendo caras assustadoras e engraçadas no espelho quando a idéia surgiu: “e se eu cortasse meus cabelos?”. Amiguinhos, não ficou ruim. Quer dizer, a frente não ficou ruim, atrás não faço idéia. Estou um pouco com cara de louco que acaba de fugir do manicômio, mas sempre tive essa cara mesmo. Saí para rua a testar as reações das pessoas e passei completamente despercebido. Fui num cinema perto de casa ver um filme argentino ruim e olhava fixamente para a moça da bilheteria tentando descobrir uma careta ou um riso contido, mas ela estava preocupada demais em trocar minha nota de dez para perceber algo estranho.

Minha rua

Chama-se Pedro Américo. Trata-se de uma via de mão-única estreita, continuação de uma via mais larga, sempre movimentada, parte integrante e inevitável de um dos dois únicos caminhos que ligam o centro à Zona Sul carioca. Às seis da tarde está sempre congestionada. No seu primeiro cruzamento há um sinal que obriga os automóveis a pararem e acelerarem em períodos sincronizados. Prédios residenciais altos, feios, cinzas e beges a cercam do lado direito de quem sobe a rua, e do lado esquerdo há construções antigas, coloridas, com a tinta sempre descascando, ocupadas por comerciantes e entremeadas por outros prédios residenciais, altos, feios, marrons-cor-de-tijolo e brancos – entre os quais inclui o que habito. A poluição dos carros impregna as paredes de alvenaria das construções dando um ar sujo ao ambiente. Os mais variados comércios florescem na região, infelizmente nenhum do tipo que torne uma rua bonita: marcenarias, botecos, igrejas evangélicas, delegacia, concessionária de motos, oficinas, estacionamento, revendedora de bebidas, lojas com material de construção. Há do lado direito da rua uma grande escada que leva em direção a favela de Santo Amaro e está sempre movimentada. Quase sempre há dois jovens sentados nas calçadas de frente a escada, fazendo sinais para alguém lá em cima. Tudo isso há menos de 50 metros da delegacia. Certa vez vi um menino fumar craque por ali. Não era essa droga que causa uma paranóia monstro? As calçadas são estreitas, com postes e fezes (que espero sinceramente serem caninas) por toda parte, e há uma fileira interminável de carros estacionados do lado esquerdo, o que obriga todo grupo a andar em fila indiana, conversando com os pescoços virados para trás. Quase sempre se pode ver velhos e negros subindo e descendo a rua, assim como jovens da classe média sempre carregando sacolas plásticas nas mãos. Todos os dias de madruga, os lixeiros passam com seus caminhões barulhentos levando lixo e garis fazem a limpeza.

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Assim como o gérmen de trigo quando úmido gera os ratos e o sangue frio e coagulado dos mortos os vermes, a escuridão produz as baratas.

domingo, 26 de agosto de 2007

O sonho de qualquer sistema econômico é criar condições para que o maior número possível de pessoas tenha poder financeiro o suficiente para se alimentar adequadamente, para terem acesso a diferentes formas de lazer e cultura, para serem relativamente educadas com capacidade de discernirem sozinhas quais atos – e principalmente os atos políticos - são bons ou maus, para estarem livre das arbitrariedades da classe dominante, para serem capazes de trocar de patrões, se necessário. Enfim, o sonho de qualquer sistema econômico é ter uma classe média o mais numerosa possível.

Se alguém no século XVIII dissesse que seria possível a situação econômica de um povo tal como é a do povo norte-americano nos dias de hoje, seria tachado de maluco e utópico.

O ódio à classe média é o ódio ao sucesso inegável do capitalismo.

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Estou lendo “Amor e exílio” de Isaac Singer. Na verdade, trata-se de uma junção dos relatos biográficos “Um menino à procura de Deus”, “Um jovem à procura de amor” e “Perdido na América”. Ando reclamando bastante de ser brasileiro e de ter nascido no fim do século XX, mas, é claro, há coisas piores, como ser judeu nas décadas de 20 e 30. E vejam bem, Isaac Singer saiu da Europa logo no começo dos anos trinta. Lendo isso fui procurar algumas informações, principalmente sobre Bogdan Chmielnitzki, que é muito citado neste livro e que se tornou o tema do primeiro livro de Singer: "Satanás em Goray". Encontrei essa página sobre os judeus na Polônia da idade média até o começo do século XIX: http://www.geocities.com/Heartland/Valley/1046/9710/971029_j.html . Estou com um espírito de tradutor no meu corpo, então aproveitem:

“Pela metade do século XVII, a posição econômica e social dos judeus poloneses parecia firmemente estabelecida. Os judeus estavam bem representados nas grandes feiras em que o comércio polonês era centrado. De particular importância para a crescente e poderosa nobreza polonesa foi o papel representado pelos judeus economicamente astutos, que freqüentemente serviam aos nobres como conselheiros e como administradores de seus estados. A estabilidade econômica foi acompanhada por um significativo desenvolvimento político e social. Já em 1551, o Rei Sigismund Augustus garantiu aos judeus o direito de elegerem seus rabbi-chefe e juízes aos quais foram dados poderes para administrarem a justiça da comunidade judia em todas as questões de acordo com os princípios de Halakha. No século XVII o Conselho das Quatro Terras (Grande Polônia, Pequena Polônia, Podolia e Volhynia) foi estabelecido pelos líderes das comunidades judias como um tipo de “Parlamento” e “Corte Suprema” dos judeus poloneses. Para os líderes dos estados poloneses, o concílio servia como um instrumento efetivo para a coleta de impostos nas comunidades judias. Na década de 40 deste século, a vida judia na Polônia era próspera, cimentada numa aliança benéfica e mútua entre os judeus e as classes governantes polonesas. E assim, não é nenhuma surpresa que a Polônia era descrita em termos muito favoráveis na literatura judia do período. A tradução de “Polônia” para o hebreu (“Polin” ou “Polanya”) foi entendida como uma dica das características especiais da vida dos judeus por lá, uma vez que “Po Lan Yah” é em hebreu “Aqui descansa Deus” ! Mas, como temos visto, um significativo nível de animosidade popular contra os judeus já estava presente, e no ano de 1648 esta hostilidade foi dramaticamente elevada como um resultado de uma rebelião nacionalista. Os judeus poloneses sofreram um massacre horribilíssimo.

A rebelião se deu na Ucrânia, onde os cossacos, um bando de servos e cavaleiros robustos e guerreiros, lideraram uma revolta contra os líderes poloneses.Os poloneses e os ucranianos não compartilhavam uma língua comum, e ainda que ambos fossem cristãos, o catolicismo dos poloneses confrontava com a ortodoxia russa dos ucranianos. De qualquer forma, o líder da rebelião de 1648-9 (conhecida como a revolta cossaca), foi Bogdan Chmielnitzki, um homem que é ainda visto por muitos como um herói popular nacionalista e ucraniano. Chmielnitzki e seus cavaleiros cossacos ressentidos com os judeus, viam estes como aliados desprezíveis da tirania política polaca e da opressão econômica. Comunidades judias inteiras foram brutalmente massacradas pelas hordas cossacas. Uma testemunha ocular desses massacres, Rabbi Nathan Hanover, descreveu os horrores...

'Os cossacos se revoltaram contra os judeus com uma crueldade terrível... Alguns deles tiveram suas peles arrancadas e suas carnes foram atiradas aos cães. As mãos e os pés de outros eram decepados e os judeus eram atirados nas estradas, onde carroças os atropelavam e os cavalos marchavam sobre eles... muitos foram enterrados vivos. Crianças eram assassinadas nos seios de suas mães e muitas crianças foram rasgadas ao meio, como peixes... não houve uma morte não natural no mundo que eles não lhes infligiram.' (N. Hanover, Yeven Metzulah, Tel Aviv, 1966, pp.31-2)

Eu percebo que isto é um retrato horrível, que pode ser bem difícil de ler. Mas penso que é importante lê-lo, em ordem para entender o horror daqueles dias. Claramente os cossacos agiram com um profundo sentimento de ódio, e não se pode duvidar que o massacre produziu uma redução no número de judeus poloneses. Centenas de milhares de judeus pereceram nas mãos dos bandos cossacos, e não menos que setecentas kehillot (comunidades) foram destruídas! Neste período de desespero, certamente muitas questões difíceis devem ter surgido. Como seria possível reconstruir ou restaurar algum nível de estabilidade social? Num nível teológico, como era possível que Deus permitisse que Seu povo sofresse tais crueldades?(...)

No ano de 1665, Shabbetai Zvi, um judeu sefardita da Smirnia na Anatólia (hoje Turquia), proclamou-se messias em Jerusalém. Com a ajuda de seu principal discípulo, uma figura carismática chamada Nathan de Gaza (que dizia ser um profeta), o movimento messiânico se espalhou como fogo selvagem através do mundo judeu. Rumores dos poderes miraculosos do Messias abundaram, dez mil judeus rapidamente fizeram preparações para abandonarem seus lares na Diáspora, para assim eles poderem ser miraculosamente transportados “na asas das águias” até Eretz Yisrael! Muitos fecharam suas lojas e iniciaram jejuns especiais e outros tipos extremos de purificações. Aqui vai uma descrição destes eventos bizarros, tomados da “História da Império Turco” de Sir Paul Rycaut (que é um relato de primeira mão do período):

'Alguns judeus se enterraram em seus jardins, cobrindo seus corpos nus com terra até a cabeça, permanecendo em suas camas de sujeira até seus corpos endurecerem com o frio e a umidade. Outros derretiam cera em seus ombros, outros rolavam na neve e atiravam seus corpos na mais fria estação do inverno no mar, nas águas congeladas... Todo o negócio foi deixado de lado, ninguém trabalhava ou abria suas lojas, a menos que se limpasse de suas lojas qualquer merchandise sobre qualquer preço*...'

Bem! Um pouco difícil de acreditar, né? Eu admito que é difícil de imaginar as pessoas fazendo coisas como essas, mas acho que isto tudo testemunha a fé completa e absoluta que esses judeus tinham na vinda do messias, e as medidas extremas necessárias para se purificarem antes da grande Redenção. Creio que isto reflete o quão profundamente os judeus necessitavam ser redimidos neste período de dificuldades. Numa palavra, o “Messias veio”, porque os judeus desejavam desesperadamente que um Messias os salvasse. E assim, o mundo judeu ficou profundamente dividido entre os seguidores de Shabbetai Zvi, e aqueles que o consideravam um impostor. O sultão turco ficou muito preocupado com os efeitos desestabilizadores desta figura messiânica, e por isso prendeu Shabbetai Zvi. No início, Shabbetai manteve sua corte na prisão, dividindo o mundo entre seus fiéis seguidores*, até que ele foi obrigado a escolher entre se converter ao Islã ou encarar a execução pelas mãos dos arqueiros reais. E desse modo, Shabbetai Zvi se converteu ao Islã, e o mundo judeu, ainda cambaleante dos horríveis massacres de 1648-49, agora encarava uma tremenda crise espiritual.”


* Trechos em que duvido um pouco da minha tradução. Aliás duvido da tradução inteira, mas como é de graça, você não pode reclamar.

Um poquinho de polêmica barata

Então João, pronto para mais uma entrevista?
Só se for agora.

Por que você entrou e depois saiu do curso de Ciências Sociais?
Há! Quer que eu brigue com quase todos os meus amigos, né? Tudo bem, vamos lá. De um modo geral sai do curso pela mesma razão que entrei: instinto. Não sabia explicar na época, não sei se saberia explicar hoje. Mas vou tentar. Entrei porque queria fazer algo realmente importante. Sei que as pessoas que fazem engenharia computacional acham seu trabalho importante, mas não o é. Há cem anos não existiam computadores. Sempre tive, para usar uma expressão desgastada, consciência histórica. Se não existia há cem anos então não tem importância alguma. Mas aí, quando entrei no curso descobri que as ciências sociais até tinham cem anos, mas não tinham duzentos. E se não tem duzentos anos não tem importância.

Espera aí. Você está dizendo que saiu das Ciências Sociais só porque o curso não tinha duzentos anos?
É, foi o que eu disse. Mas é mentira, claro. Quando saí sentia um impulso tão forte nesta direção que qualquer resistência era irrelevante. O fato é que as ciências sociais são importantes, mas de uma maneira negativa. Ela nos ajuda a compreender a tragédia que foi o século XX. Fenômenos como o nazismo e o comunismo seriam impensáveis sem a sociologia. Foram as ciências sociais que deram os instrumentos para o estado manipular a massa, esquadrinhá-la, descobrir seus desejos mais baixos e realizá-los a preços altos. Aliás, foi ela que inventou a massa, ela potencializou o poder, ela legitima o que quiser, ela efetiva o que for ilegitimável. A neutralidade axiológica de Weber – ele que é tido como a direita da sociologia - resume muito bem este trabalho. Encontremos o meio de manipular as massas e não nos perguntemos pelos valores. Isso explica a sociologia e o século XX.

Mas também há uma sociologia liberal...
Mentira! (Bate na mesa) Calúnia! Sociologia e liberalismo são dois termos incompatíveis. A ausência de sociólogos liberais não é nenhuma coincidência inexplicável. FHC, o sociólogo, foi tachado de neo-liberal, ele que fez a relação arrecadação de impostos/PIB subir de 25% para mais de 30%. Lula não é um sociólogo, mas está cercado por eles, e por isso já estamos chegando em gloriosos 35%.

Mas por que não haveria uma sociologia liberal? Que idéia maluca é essa?
O que faz um sociólogo ou um cientista político além de oferecer estratégias aos homens políticos? A maioria segue tal profissão na esperança de virarem uma espécie de guru e iluminar o mundo político com sua força intelectual cheia de bondade e pureza. Claro, acabam invariavelmente servindo aos desejos dos políticos e se preocupando com o impacto que tal medida teria na popularidade destes e em medidas para melhorar tal impacto. Em suma, um sociólogo apenas serve ao estado e não é desejo deste ver suas forças diminuídas. Portanto não há sociologia liberal.
Quer ver? Fico pensando num recenseador entrando na casa de um cavalheiro do século XVII perguntando a renda e a escolaridade deste. Seria expulso a bengaladas. O que interessa ao governo minha raça? Minhas crenças religiosas? Minha profissão? Isto para não falar em outras pesquisas, sempre com o fomento de algum órgão público, perguntando quantas vezes o casal dá no coro por semana. É claro com estudiosos como esses o governos consegue legitimar qualquer coisa.
Mas voltemos a Weber, me empolguei agora. Ele, a direita da sociologia. Confesso não saber quase nada sobre ele, mas me lembro de sua fórmula: o estado como um monopólio do uso legítimo da força. Que idéia de jerico! O estado não detêm esse monopólio, ou pelo menos não deveria. Sua observância estrita diz que sou impedido de reagir violentamente se me sentir ameaçado, o que é absurdo. Também impede os pais de educarem seus filhos com o cajado. Poderíamos tentar consertar dizendo que o estado tem o monopólio do poder de legitimizar um uso da violência, mas isto é falso também, não tem esse monopólio não. Por um acaso o estado é um semi-deus cujas decisões sobre o uso da violência são inquestionáveis? Deve ser por isso que as pessoas escrevem estado com letra maiúscula. Veja bem, há agora um projeto de lei ou este projeto já foi aprovado, não sei e na verdade isto não tem importância alguma, estamos no Brasil meu bem,, enfim, como ia dizendo, há um projeto que proíbe um pai de educar seu filho a chineladas. Tentem imaginar uma proposta destas discutida nos séculos XVII e XVIII, época do absolutismo, e entenderão sobre o que falo. Se Luiz XIV tivesse essa idéia estúpida a Revolução Francesa teria se iniciado mais cedo. Fora do âmbito estritamente político, o governante não possui legitimidade nenhuma. É claro que Luiz XIV desejaria ampliar os seus poderes, mas não podia, não tinha esta legitimidade, ainda não tinha nascido um jumento com a brilhante idéia de lhe oferecer tal legitimidade. Weber fez isto por Hitler e Stálin. O absolutismo se caracteriza pela concentração do poder político na mão de um indivíduo, já o totalitarismo se caracteriza pela concentração de todo poder na mão de um indivíduo. O absolutismo é ruim, o totalitarismo é monstruoso e o que os separa é a sociologia.

Sua tese é ridícula. Como assim? Os governantes de antigamente viviam interferindo na vida privada das pessoas. Oscar Wilde foi preso por ser homossexual.
Bem, vejam bem a diferença. Este poder de julgar questões morais, não políticas, só aparentemente era controlado pelo estado, mas pertencia muito antes aos costumes, ao senso comum do povo e suas crenças religiosas.

E faz diferença? Faz diferença para o homossexual ser preso no governo da rainha Vitória ou no governo de Fidel Castro?
Claro. Por que os países cristãos criminalizavam o homossexualismo? Porque ele atentava contra a religião dominante. Era uma arbitrariedade, claro, mas uma arbitrariedade nascida da tradição, que queiram ou não, ajudou a construir a civilização ocidental. Já Fidel Castro o proíbe porque ele não acha legal. É claro, em ambos os casos são arbitrariedade, ambos são ruins. Mas, se tiver que escolher, prefiro a arbitrariedade da tradição, que pelo menos nos já as conhecemos. Sabe-se lá que arbitrariedades vão passar pela cabeça de um ditador.
Mas o mais importante aqui é ver que antigamente o Estado não tinha legitimidade nenhuma em questões puramente éticas, era apenas mandatário de uma outra fonte de legitimidade. E é sempre bom fragmentar o poder, devemos fragmentá-lo sempre que possível. E qual foi a experiência do século XX, a experiência das ciências sociais? A concentração do poder pelo Estado, nada mais. O estado tem o poder político, moral, e se vivermos num paiseco da América do Sul ou num regime comunista, tem o poder econômico também. Esses dias vi na televisão um sociólogo, não sei quem, falando muito espantado que havia pessoas no Brasil que se consideravam primeiros devotos de Nossa Senhora da Aparecida e só depois brasileiros. Nada mais natural, mas ele ficou espantado de ver o “povo” dividido por dois poderes. Ele não pode suportar a idéia de um poder concorrente com o Estado.
Por exemplo, um dos grandes problemas das democracias atuais, incluindo a brasileira, é: Como fazer para que ela não descambe em ditadura da maioria? Ora, deve haver cláusulas que sejam livres do poder político, livres do ondular da opinião pública. Mas como fazer isso se não há nenhuma outra instância de poder relevante além do estado? É claro, isso só pode dar em merda.

Bem,agora que você já irradiou sua luz intelectual cheia de bondade e pureza, acho que já está bom. Você já deve ter conseguido destruir suas amizades das Ciências Sociais.
Pô, que isso, não me levem a mal não, gente. É brincadeira.