quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Para construir o seu sistema totalitário de governo, Lênin e Stálin criaram um código penal tão amplo que era possível prender qualquer um. Por exemplo, o parágrafo sexto do artigo 58 previa o crime de espionagem não-demonstrada. Até vejo a cena: “eu não posso ser preso, nada foi demonstrado contra mim”. “Pois então! É por isso mesmo que você está sendo preso”. Já o parágrafo oitavo previa o crime de terror. Deixemos Soljenítsin falar: “O terror era entendido de um modo particularmente extensivo: não significava simplesmente colocar bombas debaixo do carro dos governadores; mas, por exemplo, esbofetear o seu médico pessoal, se este era do Partido, do Komsomol ou ainda um miliciano ativista, isso já era terror”. Havia ainda o artigo 19 que previa que a preparação ou a intenção de um crime deveria ser punida com o mesmo rigor de um crime cometido de fato. E assim: “Não só uma ameaça direta proferida numa cervejaria (“Ainda lhe quebro a cara”) dirigida a um ativista mas uma observação feita por uma rabugenta vendedora no mercado (“Ora, vá para o inferno!”) eram qualificadas como IT, intenções terroristas, e davam fundamento à aplicação do artigo com toda a severidade”. Soljenítsin está consciente da inverossimilhança e acrescenta uma nota “Isto tem o ar de um exagero, de uma anedota, mas não fomos nós que inventamos tal anedota; estivemos presos com pessoas dessas.”


Com este instrumento foram possíveis os expurgos que a cada momento se virava contra alguma classe: em 1922 os revolucionários não comunistas, em 1927 os clérigos, em 1930 os industriários e os engenheiros, de 1930 a 32 os camponeses, em 1936-38 os comunistas mais antigos em 1945 os soldados soviéticos que foram prisioneiros de guerra dos alemães ou japoneses e por fim, em 1948 os próprios proletários.


Ouvimos aqui Krilenko, procurador da União Soviética, dizer: “Um tribunal revolucionário é um órgão de luta da classe operária contra os seus inimigos” e deve atuar “tendo em vista os interesses da Revolução... levando em conta os resultados mais desejáveis para as massas operárias e camponesas” e “Sejam quais forem as qualidades individuais (do réu), só lhe pode ser aplicado um método de avaliação: o critério do interesse da classe”.
Isto aí pode parecer muito específico, ocorrido lá na União Soviética, no começo do século, algo que está morto e enterrado, mas não é bem assim. Observamos no discurso de qualquer esquerdista, mesmo nos mais moderados, esta ânsia por culpas coletivas: “A violência é culpa da classe média”, “A AIDS e a gravidez da adolescência é culpa dos católicos”, “As mulheres que morrem tentando abortar são culpa dos homens”, “A desigualdade racial é culpa dos brancos”. Parece ser algo que faz parte mesmo da natureza da esquerda, como uma coceirinha que fica ali, esperando apenas um momento de distração de maior convicção ou de maior apoio popular. É claro, se você é a encarnação do progresso, qualquer um que fica no meio do seu caminho é um câncer a ser removido.

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