terça-feira, 13 de novembro de 2007

Tenho alguns colegas vegetarianos, mas nunca cheguei a ser amigo de um. O máximo que consegui foi me tornar amigo de ex-vegetarianos que largaram mão de frescura. É fácil entender o porquê. Se eu fosse um vegetariano ético, se acreditasse que comer um animal é tão errado quanto comer um ser humano, nem cumprimentaria um carnívoro como eu.
Seria mais ou menos como cumprimentar um canibal. Quer dizer, cumprimentar um canibal envolve certo risco de vida que não existe na relação vegetariano – carnívoro. Seria então como cumprimentar um canibal que jura só comer carne de japonês, por ser mais saborosa. Não dá para encarar como simples exotismo. Isto é monstruoso e ponto.

Aulinhas de inglês, vocês sabem, aquele papo furado todo. Há quatro ou três anos tive uma aula em que fomos estimulados a fazer um debate sobre vegetarianismo. Apresentei como argumento que the meat is so delicious that would be a stupidity not to eat it. Mas não aceitaram o argumento, não sei porquê. Ora, acho que a carne de certos animais é tão gostosa que o prazer que ela me proporcionará é maior do que o valor da vida do animal em questão.

Sim, dou pouco valor à vida dos animais. Sou um especicista irremediável. Mas valorizo um pouquinho sim. Lembro de um jantar onde, já satisfeito, queria jogar fora uns pedaços de carne que sobraram no meu prato. Meu pai, porém, me proibiu. Disse que um animal morreu para que eu me alimentasse dele e eu agora jogaria sua carne fora, desprezaria o seu sacrifício. Bem, talvez ele só estivesse puto por eu querer desperdiçar a parte mais cara da janta. Anyway, aceitei o argumento e levo-o no coração até hoje.

Agora me deixem desvalorizar a vida animal um pouco. Um dos livros que mais me marcou foi “A vigésima quinta hora” de Virgil Gheorghiu. Chama-se assim, pois o autor entende que estamos na vigésima quinta hora do dia, ou seja, o dia já acabou, não há nada a fazer além de assistir e chorar. Por aí você imagina o tom apocalíptico do livro. Ele foi escrito em 1949 mas a história do livro só vai acabar em 1951, com o início de uma terceira guerra mundial. Em certo momento o autor explica seu pessimismo: a civilização estaria apoiada sobre três colunas: o amor à verdade herdado dos gregos, o governo sob leis herdado dos romanos e a valorização incondicional da vida humana herdada do cristianismo. A história do século XX foi a ruína destes três pilares e conseqüentemente da civilização. Sempre que penso nisso não posso deixar de concordar com o autor. E é aí que começo minha crítica ao vegetarianismo. Ele é um efeito colateral da desvalorização da vida humana. Ele inexiste em períodos de saúde da civilização. Se disséssemos a alguém do século XVII que matar uma galinha equivaleria a matar um ser humano ele riria, porque esta é a única coisa sensata a se fazer diante de tal declaração. Os vegetarianos talvez se defenderão dizendo que não se trata de uma desvalorização da vida humana, mas de uma valorização da vida animal. Besteira. A vida animal não vale muita coisa. Os animais são pura natureza e a morte faz parte da natureza. Ninguém sofre com a morte de um animal. No entanto, se o jornal noticia o assassinato de um homem que nunca vimos mais gordo temos um evento lamentável. Reconhecemos no homem algo superior, que não deveria morrer. Esse algo maior não está na natureza, não está nos animais. É essa crença em algo maior que chamo, com Gheorghiu, creio eu, de valorização incondicional da vida humana. Não venha querer transferir essa valorização para a vida animal: é simplesmente forçar a barra. Ninguém sensato lamenta o veado capturado pelo leão, porque isso é natural. No entanto, todos lamentariam um ser humano capturado por um leão, ainda que tal seja também natural. A resposta, como já apontei, é que o lamentável aqui está num outro plano que o natural, plano esse em que os animais ficam do lado de fora, chupando o dedo da pata. O que os vegetarianos fazem ao dizer que devemos parar de comer carne é algo como “nós seres humanos não valemos mais que os animais, logo, visto que não nos matamos, não os devemos matar”. O problema é que se você tira o valor incondicional da vida humana, a conseqüência lógica não é o vegetarianismo, mas a legitimação do assassinato.

Há ainda outro ponto: imaginamos que todos os leões do mundo parem de comer carne. Isso acarretaria no aumento de número de zebras e veados e, provavelmente, num decorrente desequilíbrio ecológico. Agora imaginem se 6.000.000.000 de pessoas parassem de comer carne. Iria ser o caos ecológico absoluto. A morte dos animais para alimentação sempre esteve entranhada no equilíbrio ecológico do planeta, e a nossa alimentação não está de maneira alguma excluída desse processo.

E ainda temos o problema econômico: milhões de trabalhos estão ligados diretamente no consumo de carne.

Enfim, como meu bife com prazer e em paz com a consciência.

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