domingo, 23 de março de 2008

Estava lendo há pouco uma tese de doutorado sobre Leibniz. Gente, prenda a respiração aí, é preciso falar um pouquinho de filosofia para que o post se torne inteligível.

É o seguinte, num dado momento, Leibniz deseja reduzir a proposição “Páris ama Helena” a proposições na fórmula “sujeito é predicado”, pois crê que a fundamentação metafísica de toda proposição (e assim as suas condições de verdade) fica explicitada em tal forma lógico-gramatical. Pois bem, então “Páris ama Helena” se tornaria “Páris é amante eo ipso Helena é amada”. A dificuldade é entender que desgrama significa eo ispo (este texto de Leibniz está em latim). A autora da tese então analisa algumas possibilidades, entre elas a de equivalência: “Páris é amante” poderia ser sempre trocado pelo termo “Helena é amada” e o valor de verdade das proposições não se alterariam. Porém tal solução não é satisfatória. Por exemplo, poderíamos imaginar uma outra proposição “Menelau ama Helena” e então teríamos “Páris é amante” = “Helena é amada” e também “Menelau é amante” = “Helena é amada”, pelo que, poderíamos dizer, por comutação, “Páris é amante” = “Menelau é amante”, o quê, diz a autora, é falso, concluindo-se assim que eo ipso não seria uma relação de equivalência.

E então o que minha mente produziu? Algum insight filosófico-metafísico ou ao menos interpretativo? Não, o que pensei imediatamente depois de ler isto foi que se Night Shyamalan tivesse filmado Tróia ao invés de Wolfgang Petersen, este seria um final possível. Fiquei imaginando a cena em que o pobre Menelau, já no fim do filme, à luz de uma fogueira, à noite, enquanto discutia táticas com Agamenon e Odisseu, pergunta como eles iriam proteger Helena enquanto invadiam Tróia, e então, finalmente, Menelau perceberia a verdade: ele e Páris são uma e a mesma pessoa! Atordoado, Menelau caminharia para trás, sem olhar onde estava indo, tropeçando nas ondas do mar Egeu, enquanto isso se mostrava flashes do duelo do Canto III: ele teria lutava sozinho, contra ninguém, sua espada cortava apenas o ar, enquanto isso aqueus e troianos olhavam assustados com o que estava acontecendo, cochichando “o que se passa? o que se passa?” e de repente mostra Menelau num acesso de fúria gritando “Paris, você é um covarde! Você fugiu!”, e os outros soldados continuariam cochichando: “Quem é Páris?” e também “é a guerra, esta maldita guerra de dez anos, está deixando-nos todos loucos”. Então tudo se esclareceria: e Helena? Cadê ela? Se Menelau e Páris é o mesmo então Helena nunca estaria em Tróia. Ora, convenhamos, uma guerra de dez anos envolvendo milhares de soldados por conta de uma mulher foi algo que sempre soou estranho. O rapto de Helena funcionaria como aquele episódio obscuro que no final se esclarece: a sua mulher estaria na Lacedemônia, sempre esteve, onde mais ela estaria? Ou então ela teria morrido, talvez até por culpa ou negligência de Menelau. “Sim, essa guerra não tem nada a ver com Helena! Como teria? Aí, Zeus! Como foi eu não percebi isto antes? É o petróleo! É o maldito petróleo a causa de tudo isto!” Menelau enlouquece, investe contra Agamenon que o imobiliza e manda prendê-lo. Na manhã seguinte Agamenon em meio a batalhas vai visitar o irmão preso, ele já está melhor, mais calmo, pede desculpas por tudo. E então as explicações psicológicas: a confusão de dois objetos muito queridos como o fim da guerra e a mulher amada, ou então a guerra como fuga para uma culpa passada.

Acho que ficaria mais legal que a Tróia de Petersen. Se for para desfigurar a história original que a desfiguremos direito.

Nenhum comentário: