terça-feira, 24 de março de 2009

Minha família, tanto o lado paterno quanto o materno, vem de uma pequena cidade do sul de Minas Gerais, cerca de cem mil habitantes, chamada Itajubá. Não sei se é essa origem caipira ou outra coisa, mas o fato é que estamos acostumados, em nossos banquetes familiares, a comer, como se fosse terça-feira, pratos que meus amigos belo-horizontinos ou cariocas nem sabiam ser comestíveis. Língua de boi, pato, coelho, rã, ostra, cordeiro e outras iguarias que não posso revelar sob pena de encrencar a mim e a minha família com o Ibama. Nunca entendi, no que sou acompanhado por muito dos meus familiares (não todos, é verdade, mas muitos deles), todo esse nojo que certas pessoas dirigem a comidas exóticas, como os cachorros ou gafanhotos dos asiáticos, o ovo podre preparado chinês ou o escargot francês. Provaria tranquilamente tais coisas. Você pode não apoiar toda essa minha tolerância culinária, mas se deseja experimentar algo menos usual, como coelho ou dobradinha, mas não consegue, darei algumas dicas importantes de como se provar um novo prato.

Primeiramente, o mais óbvio: não faça cara feia. Coragem! O paladar é altamente psicológico. Se você for provar qualquer coisa fazendo cara feia e crendo ser aquilo uma porcaria, você obviamente não gostará do que provar. Tente normalizar o prato. Por exemplo, se for experimentar um sushi não faça cara feia e pense “eca! Peixe cru! Esse negócio deve ser horrível, por que estou provando essa porcaria, Deus meu?!” Pense antes um “Se eu fosse japonês comeria isso aqui toda semana, várias pessoas, no mundo todo, gostam e pagam caro por isso, não sou fisiologicamente diferente dessas pessoas e portanto não há porquê não gostar disso a priori”.

Segundo: Coma um bom pedaço. No fundo é a mesma dica que a primeira: coragem! Você não está provando cocô ou algo que vai querer cuspir imediatamente. É comida, caçamba!, morda um bom pedaço, mastigue calmamente. Sem fazer cara feia. Essa dica é especialmente importante com bebidas. Não se prova bebidas fortes dando bicadinhas, pois então sentirá apenas o gosto de álcool.

Terceiro: Um impulso inato de nossa mente é a assimilação do gosto: com que isso parece? Aceite esse impulso, ele é inevitável, mas vá além dele, tente-o superar. Por exemplo, imaginemos alguém muito pobre e que, por essa razão, a única carne que tenha experimentado seja músculo. Um belo dia ele é convidado à festa de casamento da filha do patrão e poderá provar um bom pedaço de filé mignon (se aportuguesamos o “filet”, por que não aportuguesamos o “mignon”? Seria divertido, filé minhão). A primeira coisa que ele pensará ao provar seu filé é “ih, parece músculo. Não acredito que se pague tanto por isso”. Não é burrice, apenas o músculo foi, de fato, a coisa mais parecida com o filé minhão que ele já provou. Mas se ele quiser aproveitar seu filé minhão, então deve ir além disso, observar o que há no filé minhão que é exclusivo. Só assim ele desenvolverá seu paladar. Caso contrário, ele irá comer o minhão pensando no músculo, e não encontrando exatamente o músculo, considerará o minhão como um músculo de segunda categoria, torto, ruim.

Quarto: Prove de novo, e de novo, e de novo. Dê uma chance ao prato, sempre tentando apreender a especificidade dele. Isso pode levar tempo. Muitas vezes o gosto de algo não é ruim, apenas difícil. Pouca gente acha cerveja ou uísque gostoso logo no primeiro gole.

Um comentário:

.Marcelly disse...

sou sua inspiração!